Posted: segunda-feira, 18 de agosto de 2008 by Ty McGregor in
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dos rascunhos de Ethan

“Não é a carne e o sangue, e sim o coração, que nos faz pais e filhos”. Schiller

O lugar tinha cheiro de poeira e estava escuro. Abri os olhos devagar, ainda sentia um pouco de dor de cabeça, e vi um pouco de sol entrando por uma fresta numa cortina pesada... Sabia que havia passado muito tempo, tudo o que lembrava era da sensação de ser espremido num túnel, e que o dia e a noite passaram rápido por mim, e eu ainda não sabia onde e com quem estava.
Levantei o corpo e recuei assustado quando um par de olhos, numa cabeça com orelhas pontudas e uma boca enorme e cheia de dentes sorriu me saudando.
- O pequeno mestre acordou! - Se eu não soubesse que aquela criatura era um elfo doméstico, teria gritado de susto.
- O senhor está com fome? Ou está com sede? Quer comer alguma coisa especial? Ou quem sabe beber um saboroso suco de abóbora? Quer mais algum cobertor? Ou quem sabe alguma coisa especial? Acho que temos um bolo na cozinha... Ah! Temos tortinhas de frutas também...Basta pedir, jovem mestre, que Sculy o atende. - e o elfo não parava de falar, levantei a mão para pedir calma e ele se encolheu. Só então notei que diferente dos elfos que eu havia conhecido, este usava um trapo sujo e rasgado cobrindo o corpo, e trazia algumas cicatrizes. Senti pena dele e tentei falar de novo.
- Onde estou?- perguntei.
- Está na grande e nobre mansão dos Selwyn. A mestra logo irá vê-lo.
- Porque me trouxeram aqui?
- Porque aqui é a sua casa...
Antes que ele falasse mais alguma coisa, o homem que me seqüestrou entrou no quarto e deu ordens:
- Sculy, deixe de conversas e arrume logo as coisas por aqui. Você garoto ponha estas roupas, deve ficar apresentável para conhecer Madame Selwyn. - jogou umas roupas na cama, e saiu.
Claro que não vesti as roupas que aquele homem mandou, e o elfo me levou para a sala apreensivo. Ao chegar no tal salão de chá, uma mulher bem velha estava sentada na ponta da mesa e o bruxo estava sentado à sua direita. A velha me olhou de cima abaixo e disse:
- Porque ele não esta usando as roupas que mandei Dunstan? Estas roupas são horríveis.
- Tia Wilhelmina, ele é jovem e precisa estar confortável, afinal somos estranhos para ele, não vamos assustá-lo, exigindo trajes formais. - e a bruxa meio a contragosto aceitou o que o homem falava e disse:
- Sente-se, não suporto atrasos na hora do chá.
Olhei para ela e mesmo sentindo fome, fiquei onde estava. O elfo tentava me puxar para a mesa e eu o ignorava. O bruxo novamente me olhou e disse:
- Ethan, você deve estar com fome e muito curioso sobre nós. Sente-se e coma enquanto conversamos. Não vamos envenená-lo.- e o elfo fez sinal afirmativo com a cabeça e eu me sentei à mesa para comer. Precisava estar forte para fugir, o bruxo pareceu ler meus pensamentos, e disse:
- Não pense em fugir. A casa está guardada magicamente contra uma fuga ou a presença de visitas indesejadas.
-Quem são vocês? Se for dinheiro o que querem, pegaram a pessoa errada. - falei.
- Olhe ao seu redor, pareço precisar de dinheiro?- a velha disse enquanto passava geléia num bolinho e o enfiava na boca.
- Se não querem dinheiro, o que querem comigo?
- Quero que viva aqui comigo...
- Não vou viver aqui, já tenho família. E eles vão vir atrás de mim. - disse erguendo o queixo.
- Eu sou sua avó...
- Não tenho avó, quer dizer tem a vovó Virna e a vovó Amélie, elas não são minhas avós de verdade ainda, mas vão ser. - eu respondi olhando para aquela mulher de aparência estranha. Notei que as mãos lembravam garras, e o rosto era cheio de rugas, e os olhos eram vazios. Ela me lembrava um corvo.
- Meu filho Dorian era o seu pai, e você vai viver aqui comigo, quer você queira ou não. - ela disse irritada e o bruxo olhou firme para ela, e ela respirou fundo para se acalmar, mas eu respondi:
- Alex e Logan são os meus pais e devem estar preocupados comigo... Alex não pode ficar preocupada, ela vai ter um bebê. - minha voz saiu um pouco tremida.
- Você esta aqui há quase 24 horas e nenhum deles apareceu. Eles não se importam com você, afinal você não tem o sangue deles. - a bruxa disse como se isso encerrasse o assunto.
- Se você é minha avó, porque nunca soube de vo... Da senhora?
- Porque seu pai desapareceu com você e sua mãe.
- E porque ele fez isso?- perguntei e o bruxo se mexeu desconfortável, ele não me olhava nos olhos.
- Porque ele não aceitava minhas or... Meus conselhos, então nós brigamos e ele desapareceu no mundo dos trouxas. Eu devia ter sido mais tolerante, e ai ele teria me deixado ajudar a criá-lo Ethan. Você é um Selwyn, precisa assumir seu lugar como meu herdeiro.
- E ele? Porque ele não faz isso?- apontei para o bruxo alto e loiro sentado na minha frente.
- Dunstan? Ele é filho de uma prima distante. Não tem sangue Selwyn, e o pior: não tem dinheiro. Não poderia assumir nossa casa, aliás, isso seria muito engraçado. - respondeu enquanto ria e o bruxo ficava com as orelhas vermelhas. Foi o chá mais longo de toda a minha. Mas deu tempo para pensar, eu precisava sair dali.


Fazia uns três dias que eu estava com eles, e não suportava mais a prisão onde estava. Sentia saudades de todos e me preocupava com Boomer.
- Que barreira mágica é esta? Tem como quebrá-la? - perguntei ao elfo quando estávamos sozinhos.
- Os elfos conjuraram uma barreira de proteção ao redor da casa. A nossa magia é mais antiga que a dos bruxos que te procuram, por isso eles não conseguem chegar aqui...
- Quem está me procurando?
- Muita gente, eles são fortes, mas nossa magia é maior.
- Eu poderia mandar um recado para a Alex? Um bilhete? Ela precisa saber que esta tudo bem comigo...
- Não mestre! Não! Não! - e ele batia a cabeça na parede desesperado.
- Esta bem, não precisa fazer isso... - procurei mudar de assunto.
- Você vive aqui há muito tempo?
- Sim, muito tempo. Fui o elfo de mestre Dorian, ele era bom comigo. Quando ele foi expulso, eu o esperei vir me buscar...
- Foi expulso? Porque?
- Porque se casou com uma moça trouxa. A mestra não tolera, a mistura de sangue...Ai eu, não devia ter falado isso...- e pegou um abajur e o quebrou na cabeça, uivando de dor. Segurei-o e mandei que parasse com aquilo.
- Fale-me sobre Dorian, conte-me como ele era. - e o elfo ficou animado em falar do homem que segundo Wilhelmina tinha sido o meu pai.
- Ele era bom com os elfos, vivia rindo ela casa, mas depois ele foi morto, ficamos tristes, como eu não sabia aonde ir, tive que ficar...
- Como ele foi morto?
- Foi assassinado por... Não posso falar isso...
- Quem o matou? Não me importa se você vai se arrebentar depois, mas vai me contar tudo. Quem o matou? Foi o Dunstan??
- Mestre Dunstan? Não, ele nunca faria isso com o mestre Dorian, ele ficou muito triste quando aconteceu... Eles eram amigos...
- Então quem matou o Dorian?
- Foi o irmão dele, Cassius. Os bruxos sangue-puro devem ser punidos com a morte quando traem o sangue se casando com um trouxa e geram uma cria mestiça, foi o que a mestra disse, e o mestre Cassius quis agradar à mãe.
- Você quer dizer que meu pai morreu porque se casou com a minha mãe?
- Sim, foi...Mas isso é passado e o jovem mestre está aqui... Agora tenho um novo amo.
- Eu?
- Sim, o jovem Ethan é meu mestre. Pode dispor de minha vida quando quiser...- e isso me fez lembrar uma coisa que havia aprendido sobre os elfos domésticos.
- Se eu sou o seu “dono”, você tem que me obedecer não é?
- Sim... Faço tudo que o mestre mandar.
Olhei bem para ele e disse:
- Eu desejo que você me leve para o rancho dos Warrick, lá é a minha casa.
O elfo me olhou de olhos arregalados e como hesitasse eu disse mais firme:
- Quero que faça isso agora. - e um som parecido com um pop foi ouvido, e me vi num lugar do rancho, onde ficam os cavalos para serem adestrados. O capataz quando me viu soltou um grito e logo todos no rancho, sabiam que eu estava de volta. Alex chorava com Boomer no colo, e Logan, me abraçava apertado.
Foi uma confusão enorme, nunca fui tão abraçado e beijado antes, enquanto eles me falavam sobre tudo que fizeram para me localizar e eu contei sobre a barreira dos elfos. Nesta hora procurei pelo Scully e ele estava num canto encolhido e parecia assustado. O apresentei para a família e todos o acolheram muito bem. Alex me puxou para pôr a mão na barriga e sentir que até o bebê estava feliz com a minha volta, pois estava chutando para todos os lados. Não demorou muito e Dunstan entrou em contato para saber se eu estava lá. Se o bruxo não estivesse na lareira, ele teria sido linchado, pela sua cara de pau. Nunca vi tanta gente, partir em minha defesa e isso o impressionou. Alex e Logan mostraram a ele a ordem do juiz, endossada pelo Ministro Schakelbolt a respeito da audiência de custódia que iria se realizar ainda naquela semana, e que ele não se atrevesse a chegar perto de mim novamente, ele olhou ao redor da sala e Alex disse:
- Eles são apenas um décimo da família Dunstan. Avise a Wilhelmina que se ela quiser acabar com os Selwyn de vez, ela que se atreva a chegar perto do meu filho novamente.
Agora eu sabia o que os pais faziam para defender os filhos e me senti orgulhoso de saber que podíamos não ter o mesmo sangue, mas Alex e Logan eram os meus pais, mesmo que o juiz não dissesse isso.