Posted: quinta-feira, 17 de janeiro de 2013 by Artemis Chronos in
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Lembranças de Artemis A. C. Chronos

Final de Julho/ Início de Agosto de 2017

Eu havia pedido para meus pais e quem sabia do assunto não falar nada para meus amigos, pois eu queria contar pessoalmente. Tuor estava fazendo o mesmo com nossos amigos, enquanto eu estava sentada em um pub no centro da Inglaterra com Clara, Haley, Keiko, Lena, Penny, Kaley e Amber. Era uma “girl’s night”, para celebrarmos o que seria o último encontro das garotas por um bom tempo, já que cada uma estaria atarefada com alguma coisa diferente.
As garotas ainda tinham mais um mês de férias, antes de começarem a vida adulta, mas eu já começaria a trabalhar na semana seguinte. Tio Quim queria que eu fizesse alguns cursos de defesa trouxa e um curso para os Bruxos de Elite do Ministério. Minhas primeiras semanas de trabalho seriam com muito treino e provavelmente, trabalho pesado!
Sem contar é claro todo o treinamento que eu receberia para cuidar dos dragões e poder abrir o segundo Habitat dos Dragões Negros em Avalon.
Mas eu não estava com arrependimentos, pois estava preparada para isso tudo!
E no momento estava extremamente feliz!!

- Vocês não notaram nada de diferente? – Eu falei radiante, segurando meu queixo com a mão direita propositalmente.
As garotas me olharam confusas de início, mas então foi uma chuva de reações diferentes.
Amber engasgou com a cerveja que tomava, enquanto Clara literalmente cuspiu cerveja em todo mundo, tossindo muito, enquanto Penny batia em suas costas me olhando de olhos arregalados. Keiko e Haley deram gritinhos, chamando a atenção de todo o bar, enquanto Lena e Kaley sorriam largamente, e pude ver que seguravam gritos também.
- Você ficou noiva? – Clara perguntou, quando conseguiu respirar.
- Não é cedo demais? – Amber completou e vi como as duas pareciam brancas como papel e comecei a rir. Lena, Kaley, Keiko e Haley estavam de pé ao meu redor, olhando para o anel, ainda falando excitadas. Depois de ter certeza que Clara estava respirando direito, Penny se juntou a elas.
- Como aconteceu? – Keiko perguntou.
- Foi Tuor ou você que pediu? – Haley perguntou.
- Quando foi? – Penny perguntou.
- Calma, uma de cada vez! – Eu falei, muito feliz e elas se acalmaram um pouco, mas ainda animadas. – Foi o Tuor que pediu na nossa viagem para Tóquio e eu aceitei de cara!
- Não sei como vocês ficaram surpresas! – Haley falou, referindo-se a Clara e Amber.
- Bom, surpresa mesmo não é. Tava na cara que você e Tuor iriam casar. – Clara falou, ainda meio chocada. – E sei que vão ser muito feliz. Mas, vocês não têm nem dois meses de formados e já noivam?! – Clara perguntou chocada e Amber assentiu e eu ri.
- Isso não quer dizer nada pra gente, queremos é ficar juntos.
- E vocês vão formar um lindo casal! – Keiko falou e vi que lágrimas começaram a surgir em seus olhos. – A primeira de nós a casar! Nossa pequenininha está crescendo! – Ela falou se jogando em cima de mim e me abraçando. Eu senti lágrimas nos meus olhos também e em pouco tempo todas estavam sentimentais.
- Quero que conte tudo! Cada detalhe! – Haley falou com energia e sorri, começando a contar como fora o pedido.

Início de Julho de 2017 – Sidney e Tóquio

Quando meus irmãos estavam para se formar em Beauxbatons, meus pais deram a eles viagens de presente. Seth escolheu viajar para o Egito com Luna e meus pais (por sinal eu era bebê). Já Griff escolheu viajar para a Disney com os amigos. Desde então, virou uma tradição de nossa família essa viagem de formatura de presente.
Eu escolhi então passar duas semanas na Austrália e Nova Zelândia, e mais duas semanas no Japão. Nossa primeira parada foi em Sidney.
Para essa viagem foram eu, Mina e Luthien, juntamente de Seth e Luna. Meu irmão e minha cunhada iriam passar duas semanas conosco conhecendo a Austrália e a Nova Zelândia, para depois irem estudar alguns animais e plantas únicos da região. Depois, Mina e Luthien iriam voltar para Londres, enquanto eu seguiria para Tóquio, para conhecer o Japão.
Para minha enorme felicidade, Tuor estava conosco! Iríamos passar 1 mês inteiro juntos de férias, pois ele também iria para Tóquio comigo. Na verdade, iríamos só nós dois para o Japão.
A Austrália e a Nova Zelândia eram lindas! As duas semanas pareceram pouco para tanto que queríamos ver e tantos passeios a fazer. Acordávamos todos os dias cedo e antes das 9 já estávamos fora do hotel, entrando em ônibus de excursões ou no carro alugado.
Começamos visitando Sidney, uma linda cidade. Obviamente visitamos a Opera House e o Aquarium. A Opera House era linda, mas obriguei todos a ficar um dia inteiro no Aquarium e cheguei a chorar de felicidade quando Seth conseguiu convencer um dos funcionários a me deixar entrar no tanque dos pinguins.
Depois fomos para Adelaide, para o Gorge Wildlife Park, onde pudemos ver de perto animais símbolos do país, como os cangurus e o coala. Luthien ficou apaixonada por eles e Seth deve ter comprado uns 5 bichinhos de pelúcia diferentes.
A viagem foi cansativa, mas extremamente divertida! Adorei passar duas semanas inteiras de férias com minhas sobrinhas e fiquei muito feliz ao ver como Tuor se dava bem com as duas. Mina simplesmente o adorava e uma noite ela me falou que ele era como um irmão que ela nunca teve e se eu largasse ele um dia, que iria parar de falar comigo!
Nessa primeira parte da viagem, eu dividia um quarto com minhas sobrinhas, Seth e Luna tinham um quarto só para eles e Tuor tinha um quarto próprio. Mas era claro que eu sempre dava um jeito de escapulir e acho que Luna convenceu Seth a fingir que não via...
Mas conhecer o Japão, foi a melhor coisa da viagem!
Sempre tive vontade de conhecer o país, repleto de uma cultura rica, onde sabedoria, tranquilidade e respeito eram extremamente importantes.
E conhecer o país dos meus sonhos com o Tuor era tudo que eu podia pedir.
Encontramos um hotel em estilo japonês clássico em um bairro mais tranquilo de Tóquio. O hotel ficava perto do metrô e como nem eu nem o Tuor sabíamos dirigir, ainda, nos deslocávamos principalmente de metrô.
A viagem para o Japão tinha sido idéia do Tuor e a princípio tínhamos pensado de viajar com alguns de nossos amigos, mas cada um estava ocupado de alguma em meados de Julho e depois gostamos da idéia de viajar sozinhos.
Eu estava um pouco chateada porque iríamos visitar o Japão no verão e as flores de cerejeira, sakuras, já teriam florescido. Sempre amei as flores de sakura e queria muito ver os festivais de apreciação delas que aconteciam por todo o Japão na primavera. Por muito pouco eu também perdera o Tanabata, Festival das Estrelas, pois acontecia no início de Julho, quando estava na Austrália. Mas ainda estava muito animada por conhecer o país do sol nascente!
Os três primeiros dias foram gastos visitando Tóquio. A cidade tinha muita coisa para oferecer, desde museus e templos antigos, à grandes lojas e museus super tecnológicos. Eu ficava maravilhada com toda aquela tecnologia trouxa! Já havia visitado Nova Iorque e me acostumara aos milhares de telões brilhantes. Mas em Tóquio isso tomava um outro nível, sem deixar de ser muito bonito.
Visitamos Tia Yulli e Tio Sergei e eles nos levaram em uma viagem culinária pela cidade. Keiko estava na Inglaterra, mas Hiro nos acompanhou nesse passeio. Hiro decidiu nos dar intimidade e não andou muito com a gente, mas sempre que precisávamos de ajuda, ligávamos desesperados para ele.
A comunicação com os japoneses foi facilitada por um feitiço que Tio Sergei nos ensinou. Era um feitiço que traduzia automaticamente nossas palavras em inglês para o japonês e que nos fazia entendê-los em inglês. Mesmo assim, eu e Tuor nos arriscamos em falar japonês de verdade e nos divertíamos muito.
Estava adorando o nosso clima de lua-de-mel, de casal recém casado! Acordar todo dia do lado dele era maravilhoso! E as noites, manhãs, tardes...
Me peguei uma manhã pensando em como seria casar com ele. Comecei a imaginar a cerimônia de casamento, que local poderíamos casar, quem seriam os padrinhos etc. Eu sorri comigo mesma, percebendo o quão sonhadora estava.
- Acorda dorminhoca. – Tuor falou, beijando meu pescoço e eu me espreguicei lentamente, abraçando seu pescoço. O puxei para a cama e ele se deitou do meu lado sorrindo.
- Só mais um pouquinho? – Eu pedi e ele riu.
- Já te deixei dormir por quase uma hora desde que acordei! Agora vamos levantar, temos um dia cheio hoje!
- Onde vamos mesmo? – Eu perguntei e vi que ele já estava arrumado.
- Primeiro, vamos almoçar em um restaurante que fica na beira da baía. E depois vamos em uma loja para colocarmos nossos kimonos! – Ele falou animado e levantou uma sacola enorme. Eu me animei na mesma hora e pulei da cama, tinha esquecido da idéia do Hiro.
- Hoje é o Umi no hi! – Eu falei alegre e o beijei, antes de correr para o banheiro para tomar banho e me arrumar.
O Umi no hi era o Dia do Oceano, um feriado que acontecia na terceira segunda-feira de Julho e procurava agradecer ao Oceano e mostrar sua importância para o Japão. Tínhamos programado nossa viagem para pelo menos estar presente nele. Hiro tinha nos dito que esse feriado era geralmente comemorado na praia, mas que tinha um templo em uma das ilhas da baía de Tóquio que tinha um festival comemorativo.
Fora idéia do Hiro que usássemos kimonos e logo adorei a idéia. Ele nos ajudou a comprar dois kimonos e indicou uma loja, bem perto do nosso hotel, que poderia nos ajudar a colocar a roupa. Um kimono não era uma roupa fácil de ser colocada e ser usada.
E realmente era muito difícil!
Um kimono completo é composto por várias camadas de tecido, algumas muito apertados para salientar a postura feminina. E era impossível colocar sozinha.
Meu kimono era todo roxo com desenhos de flores de sakura em tons de rosa ao longo dele todo. Havia uma faixa vermelha em minha cintura e uma grande flor de sakura em flor desenhada às costas.
A loja, que costumava alugar kimonos para turistas, era especialista em kimonos e em treinar pessoas na arte do uso de um kimono. Eu levei 3 horas para ficar pronta e pelo que sei, Tuor levou umas 2 horas também. Tive direito inclusive a uma maquiagem clássica e uma aula rápida de como andar de kimono e sandália.
Já eram quase quatro da tarde quando sai do quarto onde estava sendo arrumada e vi que Tuor e Hiro já estavam prontos. Os dois se levantaram e fizeram uma reverência para mim, enquanto eu fazia o mesmo com um leque japonês nas mãos.
Os dois estavam lindos!
Hiro usava um kimono verde musgo com uma espécie de casaco leve, branco, por cima de tudo. Clara iria adorar vê-lo assim. Tuor usava um kimono que combinava com o meu. O kimono era de um tom forte de azul, muito próximo do roxo, com o mesmo tipo de casaco leve e branco por cima. E como ele estava lindo naquela roupa!
- Você está linda! – Tuor falou e vi como ficou sem fôlego. Ele me deu um beijo leve nos lábios, mas briguei com ele.
- Levei quase 4 horas para ficar pronta, não estrague minha maquiagem! Não antes de uma foto pelo menos! – Eu falei e os dois riram.
A funcionária da loja tirou uma foto nossa e nos agradeceu em japonês. Quando saímos, uma espécie de carruagem nos esperava e vi que Tia Yulli e Tio Sergei estavam sentados nela, ambos de kimono. Tia Yulli parecia uma gueixa de tão linda e segundo ela, eu também passava fácil por japonesa de verdade. Agora Tio Sergei, Hiro e Tuor não enganavam ninguém com aqueles cabelos loiros e olhos claros. Coitado do Hiro era japonês de nascença, mas sempre o consideravam como um turista. Nos acomodamos na carruagem e fomos para o porto próximo, onde haveria uma barca para nos levar para o templo.
A ilha era muito arborizada e bela, e estava cheia! Mas haviam poucos turistas, pois Tia Yulli me explicou que o templo era administrado por bruxos e apenas cidadãos japoneses costumavam ir lá.
O templo também era muito belo, em arquitetura típica japonesa com seus arcos pontiagudos e cheios de desenhos dos dragões orientais. Haviam lanternas japonesas penduradas por todo o lugar, assim como nas diversas fontes. As lanternas já estavam acessas, apesar de ainda haver sol, e davam um ar muito bonito para o local.
Hiro ia contando sobre as cerimônias do Umi no hi e sobre outras cerimônias que eram realizadas no local e eu devorava tudo avidamente. Passeamos muito e perdi a noção da hora, enquanto brincávamos em barracas e provávamos comidas típicas de festivais.
Já era de noite, quando Tuor me pegou pela mão sorrindo, dizendo que tinha uma surpresa e nos afastamos dos outros.
- Daqui há alguns minutos haverão fogos de artifício, mas quero te mostrar algo antes.
- O que é?
- Vou te vendar, tá bom? – Ele falou e eu assenti, muito curiosa. Ele pegou um lenço azul e vendou meus olhos, me guiando.
Senti ele me guiando para uma parte mais reservada do templo, pois os sons ficavam cada vez mais suaves. Deixei meus sentidos se espalharem e percebi como a ilha era cheia de vida e o templo também.
- Pode abrir os olhos. – Ouvi a voz de Tuor ao meu lado e ele tirou a venda, enquanto me segurava pela cintura.
Abri os olhos lentamente e fiquei maravilhada.
Diante de mim estavam pelo menos umas 20 árvores de sakura lado a lado, formando uma espécie de túnel. E o melhor de tudo: todas em flor.
Haviam flores brancas, flores vermelhas e flores rosas, todas muito delicadas e belas. Um vento começou a soprar levemente e as árvores balançavam suavemente. Senti meus olhos cheios de lágrimas e tapei a boca com as mãos, maravilhada.
- Essas sakuras são enfeitiçadas, elas nunca deixam de florescer. Quando soube disso, eu quis te trazer pra cá, mas sem você saber. – Tuor falou do meu lado e eu olhei para ele, sem conseguir dizer uma palavra. – Surpresa! – Ele falou com um sorriso e eu o puxei para um longo beijo, maravilhada pelo lindo presente.
- Eu adorei, Tuor! Muito obrigada! – Eu consegui falar e ele sorriu, me abraçando com força.
- E tem mais.
- Mais? – Eu perguntei curiosa. Ele me levou até debaixo de uma árvore de sakura rosa e sentou-se na grama.
Eu fiquei um pouco em pé, acariciando o tronco da árvore com carinho. Algumas flores começaram a cair com o vento e vi quando Tuor pegou uma flor e me sentei ao seu lado, para que ele a colocasse em meus cabelos.
Vi que ele estava um pouco nervoso, mas sorria, e fiquei ainda mais curiosa.
Ele então tirou uma caixa de madeira polida com mais ou menos um palmo de largura e de comprimento, com uns 10 centímetros de altura. Havia uma flor de lótus em baixo relevo na parte de cima.
- Está com seu pingente?
- Eu nunca me separo dele! – Eu falei e tirei o pingente de meu pescoço.
- Coloque sobre a flor. – Eu obedeci, com um olhar interrogatório e para minha surpresa a flor encaixou perfeitamente no entalhe. Senti como se a caixa vibrasse, mas nada aconteceu – Está faltando algo, não acha?
- O que você está tramando? – Ele falou e riu, enquanto tirava o pingente do martelo de Thor que eu havia lhe dado no nosso primeiro aniversário de namoro.
- Tire a flor e coloque o martelo. – Eu obedeci novamente e coloquei o martelo no entalhe. Para minha surpresa maior, o martelo afundou no entalhe mesclando-se ao entalhe da flor. – Ainda está faltando algo?
Eu ergui uma sobrancelha e coloquei a minha flor de lótus por cima e novamente ela encaixou perfeitamente. Ouvi um clique e a caixa se abriu. Ele me incentivou a levantá-la com um sorriso.
Eu levantei a tampa curiosa e novamente fiquei sem fala. Senti lágrimas nos meus olhos e olhei para ele sem acreditar.
- Essa caixa é como eu e você. – Tuor falou, pegando minhas mãos e me olhando intensamente nos olhos. Eu ainda estava em fala e senti as lágrimas escorrendo pelo meu rosto. – Ela só está completa quando estamos juntos. Artemis Arashi Capter Chronos, você é a mulher mais incrível que eu conheci em toda a minha vida e eu te amo como jamais achei que ia amar alguém. Você aceita se casar comigo?
Ele perguntou sorrindo e eu apertei sua mão.
Dentro da caixa estavam duas alianças de ouro, colocadas juntas sobre um veludo vermelho.
- É claro que sim! – Eu finalmente consegui falar e me joguei em seus braços, soluçando.
As lágrimas desciam pelo meu rosto, mas eram lágrimas de felicidade. Eu estava feliz como nunca me senti e o apertei com força. – Eu te amo!
Vi que ele também chorava e nos beijamos longamente.
Ele então pegou minha mão direita e pegou uma das alianças, colocando-a em meu dedo anelar, beijando-o em seguida. Eu fiz o mesmo com a outra aliança e o beijei novamente.
Nesse momento, os fogos de artifício estouraram e a noite se encheu de luzes de milhares de cores. Colocamos nossos pingentes de volta no pescoço e ele me ajudou a levantar.
Andamos até perto da baía, de onde tínhamos uma visão privilegiada dos fogos.
Apertamos nossas mãos com força.
Havia tanto que eu queria falar para ele, tanto a agradecer.
Mas naquele momento eu não conseguia dizer nada, apenas olhar para ele e para o reflexo das luzes em seu rosto radiante. E eu sabia como estava radiante também.

Posted: terça-feira, 15 de janeiro de 2013 by Autor convidado in
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Novembro de 2018


Se houve alguma vez em que me questionei sobre minha decisão de me candidatar ao curso preparatório para os Bruxos de Elite, foi naquele novembro de 2018. Sob a supervisão do Tenente Sanders e dos professores Seth Chronos e Calleb Langston, a turma estava sendo submetida a uma bateria de exercícios projetados para fazer o candidato desistir. Éramos constantemente incentivados a pedir para sair, sempre aos berros, mas até agora apenas dois alunos haviam jogado a toalha. O resto seguia aos tropeços, mas firme. Estávamos passando por uma verdadeira provação.

Éramos divididos em duplas diferentes o tempo todo e estava trabalhando com James naquela quinta-feira. O último exercício do dia era carregar morro acima um saco de areia que pesava 70 kg. Ele representava um soldado ferido e tínhamos que transportá-lo até a base com cuidado e depressa, duas palavras que não costumam combinar. Depois de subir mais de 100 degraus, a sensação que tinha era de que meus braços iam cair a qualquer momento. Não muito na nossa frente, Kaley e Julian iam arrastando o saco já sem quase nenhum cuidado. Kaley estava com jeito de que ia vomitar.

- Não joga ele no chão que ele está ferido! – o professor Chronos gritou com Julian e Kaley quando eles deixaram o saco cair no chão de qualquer jeito para descansarem alguns segundos e começou a fazer massagem cardíaca nele.
- Quando o corpo não agüenta, é a cabeça que manda! – o Tenente Sanders gritou no nosso ouvido e erguemos mais o saco – Minha filha de 11 anos faz isso!

Mais atrás Elena e Penny vinham com o saco nos ombros e já não tinham mais forças para andar. Paravam a todo instante para ajeitar o peso e o professor Langston vinha no calcanhar delas, disposto a fazê-las abandonar a turma.

- As senhoritas estão morrendo? Querem desistir?– ouvi-o gritar e elas responderem um “nunca senhor” sem muita empolgação – Então avancem!

James parou de correr para ajustarmos o saco de areia nos ombros e tentar chegar até o final cansando menos e nesse segundo em que paramos vi Daniel e Kevin passando Elena e Penny. Daniel, que era mais forte que Kevin, puxou todo o peso para si para conseguir correr mais depressa, deixando o outro sem nada na mão. James bateu a mão no rosto um segundo antes do Tenente Sanders ver a cena e correr até eles.

- O senhor vai deixar o seu companheiro para trás? – perguntou duro para Kevin, que não sabia se respondia ou voltava para ajudar Daniel – O senhor vai deixar o seu companheiro carregar todo o peso?
- Não senhor! – ele enfim respondeu, gaguejando.
- REGRA Nº 15, CADETE! – o Tenente gritou tão alto que achei que Kevin fosse borrar as calças.
- Sempre trabalhe em equipe, senhor! – Kevin respondeu já voltando para ajudar Daniel.
- Se o senhor estiver muito cansado, se acha que não precisa carregar um soldado ferido em batalha e prefere deixá-lo morrer, basta o senhor avisar e paramos agora o treinamento. É isso que o senhor quer?
- Não senhor! – respondeu outra vez, já com metade do saco de areia no ombro.
- Se não chegarmos nessa maldita base nos próximos cinco minutos, você vai ter que carregar o saco e eu – disse secando o suor do rosto, que já estava gelado – Estou prestes a desmaiar.
- Então vamos apertar o passo, porque já estou quase vomitando com um peso morto só, dois eu não aguento!

Alcançamos a base antes que eu perdesse os sentidos e no instante em que largamos – com cuidado – o saco de areia na maca, James parou ao lado de Kaley para vomitar toda a água que havia bebido durante o dia. Olhei para Julian, que estava estirado feito o homem vitruviano no meio do pátio, e me larguei ao lado dele. Minha cabeça parecia um tambor, acho que nunca senti uma dor tão forte. Quando fechava os olhos, tudo que via eram pontos brancos.

- Acho que acabei de ver meu tio-avô que morreu ano passado – Julian comentou fechando os olhos com força e abrindo outra vez, parecendo atordoado – Ele parecia feliz.
- Não o siga até a luz. Fique conosco.
- Muito bem, senhoritas! – ouvi a voz do Tenente Sanders entrando no pátio, mas não consegui mover sequer a cabeça para olhar – São 16h da tarde agora. Quem conseguiu chegar até aqui com o soldado ferido vivo, está liberado das atividades por hoje. Amanhã faremos um treinamento de rastreamento! – sua voz tinha um tom de empolgação preocupante – Aconselho-os a descansarem bem essa noite e que comecem imediatamente.

O treinamento de rastreamento pode ser resumido em uma palavra: perdidos. Fomos arrancados da cama às 3h da manhã e divididos em duplas outra vez, cada par foi abandonado com vendas nos olhos em um ponto diferente no meio de uma floresta. Minha parceira do dia era Elena, o que tornou a coisa toda ao menos um pouco divertida, mas munidas apenas de uma bússola (não tínhamos autorização de usar o feitiço quatro pontos e tivemos as varinhas confiscadas), levamos quase seis horas para encontrar o caminho de volta. Já havia amanhecido há séculos quando chegamos à base completamente sujas de lama e arranhadas, sem falar na fome.

- Deixem a bússola com o professor Chronos e estão dispensados pelo resto do dia – o professor Langston avisou.
- Semana que vem é a nossa tão aguardada aula de Sobrevivência na Selva e ela vai durar cinco dias – Chronos dizia bastante empolgado. Isso nunca era bom sinal – Tragam casacos, costuma fazer frio na mata.
- Cadete Beckett, antes de ir embora passe em meu escritório – o Tenente Sanders me parou quando estava saindo com Elena.
- Sim senhor.
- O que você fez? – Elena perguntou rindo.
- Não faço ideia. Será que devo me preocupar?
- O Tenente chamou você no escritório dele fora do horário de aula. Você sempre deve se preocupar.
- Meninas, James pediu para avisar que Kaley está na enfermaria – Kevin passou do nosso lado vindo da direção contrária.
- Merlin, o que houve? – falamos ao mesmo tempo.
- Não sei, ele só pediu para avisar vocês, acho melhor passarem lá.

Saímos tão desesperadas para a enfermaria que atropelamos um garoto do 1º ano que vinha carregando um cesto de roupa suja pelo corredor. Só gritamos um “sinto muito!” enquanto subíamos as escadas apressadas, mas já tivemos que lavar muitas vezes o mesmo cesto de roupas quando éramos novatas por causa de algum “acidente” causado por um veterano, ele ia superar.

Kaley estava acomodada em uma das camas com a cara mais pálida do mundo, mas parecia bem. James estava plantado ao seu lado feito um cão de guarda e contou que eles perderam o cantil com água na metade da madrugada e ela começou a se sentir mal quando já estava perto da base, mas ainda tinham pelo menos meia hora de caminhada pela frente. Desidratada e sem ter descansado o bastante, Kaley desmaiou e ele teve que carregá-la até a base.

Logo percebemos que estávamos sobrando. James já estava cuidando muito bem dela e não tinha nada que pudéssemos fazer para ajuda-la a melhorar rápido, então nos despedimos pedindo que obedecesse ao médico e deixamos os dois sozinhos outra vez. Elena também se despediu dizendo que queria chegar em casa antes do almoço e voltei aos dormitórios para trocar de roupa e ir até o escritório do Tenente Sanders.

Ele não estava lá ainda quando cheguei, mas se aprendi uma coisa nesses quase um ano e meio como cadete é que se um superior mandou você ir até sua sala, você deve esperar do lado de fora dela até que ele o receba independente do tempo que isso leve. Naquele caso, esperei por quase 20 minutos até que ele finalmente apareceu. Abriu a porta e gesticulou para que eu entrasse, mas fiquei de pé esperando que ele se acomodasse e me autorizasse a sentar. Outra coisa muito importante que nossa turma aprendeu de forma dura ainda no 1º dia de aula.

- Sente-se – ele apontou para a cadeira e obedeci – Você sabe por que lhe chamei aqui hoje, cadete?
- Não senhor.
- Regra nº 10.
- Nunca se envolva pessoalmente em um caso – disse imediatamente.
- Exato. Terminei de avaliar os trabalhos da turma sobre os arquivos mortos e você quebrou essa regra, não quebrou? – ele falou sério e assenti, começando a sentir minha mão gelar. Ele ia me suspender.
- Sim, eu quebrei, mas- - ele ergueu a mão e me cortou.
- Não estou pedindo explicações, perguntei apenas se havia quebrado a regra. Você a quebrou? – e assenti reafirmando – Se já tivesse um distintivo, cadete, estaria tendo o mesmo apreendido e seria suspensa. No entanto, você ainda é apenas uma aluna. E o seu relatório está entre os seis que chamaram a minha atenção. Você apresentou mais do que o suficiente para reabrir o caso e como havia prometido aos alunos que conseguissem provas suficientes para isso, vou permitir que faça parte da investigação.
- Eu não vou ser suspensa? – disse surpresa e ele me encarou com a sobrancelha erguida – Senhor. – acrescentei depressa.
- Dessa vez vai sair apenas com um aviso, mas se passar por cima de mais alguma regra por qualquer que seja o motivo, não me importa se ainda não se formou, você será punida.
- Sim senhor, não vou descumprir mais nenhuma regra.
-E seu acesso à investigação será limitado. Ainda uma aluna ou não, continua sendo um caso pessoal. Se em algum momento eu achar que isso está atrapalhando seu julgamento, irei afasta-la do caso.
- Não vou deixar que nada atrapalhe, senhor. Sou racional, sei separar as coisas.
- Não faça promessas que não pode cumprir, cadete Beckett.
- Essa promessa eu vou cumprir, senhor.
- Veremos. O caso será reaberto em breve. Regra nº 14.
- Nunca esteja inacessível.
- Está dispensada.

Assenti sem dizer mais nada e levantei, saindo da sala dele tentando ao máximo não correr. Ele ia reabrir o caso dos meus pais. Precisava sair daquele quartel o mais depressa possível e contar a novidade a Rupert. Dessa vez nem passei pela portaria, aparatei direto no corredor do andar dele e entrei com a chave que ele havia me dado.

- Rupert? – chamei quando vi a sala deserta e o loft em silêncio total – Rupert, está em casa?
- Escritório! – ouvi-o gritar e larguei a mochila na sala, indo até ele.
- Rupert? – chamei outra vez quando abri a porta do escritório e vi que ele estava sentado no chão.
- Um segundo – disse levantando um dedo sem tirar o olho da tela.

Pela maneira que digitava estava terminando algum capitulo, mas não sabia que já havia começado a trabalhar no 3º livro. O 2º, Câmara Secreta, havia sido lançado a menos de seis meses, e Rupert ainda estava fazendo tour de divulgação. Fiquei vendo ele digitar sem nem piscar por quase um minuto, até que finalmente parou e fechou o laptop antes de levantar e vir ao meu encontro.

- Ei, chegou cedo hoje – disse me abraçando e me beijando.
- Eles cansaram de nos torturar pela semana, deram um descanso pra recomeçar tudo na segunda. Não sabia que já estava escrevendo o 3º livro.
- Não, não era o Prisioneiro de Azkaban, só estava anotando algumas coisas.
- O tal livro misterioso que você não quer dizer sobre o que é? - perguntei um pouco impaciente – Você já está nesse mistério desde setembro, quando vai me contar?
- Já tem um ano, na verdade... – ele riu, mas eu continuava séria – Ok, você quer mesmo saber?
- Por favor!
- Não é nada que vá ser feito antes de encerrar os sete livros que estão me pagando pra escrever, mas estou pensando em escrever uma série sobre a vida dos aurores. Começando com a academia, me baseando nas histórias que você vem me contando desde o ano passado.
- Rup, essa é uma ótima ideia! – disse animada, mas ele ainda parecia receoso – Por que não queria me contar?
- Queria ter algo mais certo antes de falar alguma coisa, ainda nem conversei com o meu editor. E também porque não sabia bem como você ia reagir.
- E por que eu não ia gostar?
- Porque eu quero basear a personagem principal em você – ele me puxou para mais junto dele com um sorriso hesitante – Você se importa?
- Você vai citar meu nome em entrevistas?
- Só se você quiser.
- Bom, nesse caso não cite e fique a vontade para escrever o que quiser – respondi o beijando e ele parecia mais aliviado.
- Quer ler o primeiro capitulo?
- Logico, mas primeiro preciso contar a novidade – disse me soltando do abraço e sentando na poltrona – O Tenente me chamou na sala dele agora pouco e primeiro me deu uma bronca por ter escolhido o caso dos meus pais para o projeto, me lembrou que quebrei uma de suas regras e que numa próxima vez ele não vai perdoar, mas depois disse que o meu trabalho foi um dos escolhidos para ter o caso reaberto.
- Amber, isso é ótimo! – Rup sentou no braço da poltrona tão empolgado quanto eu – Eles vão voltar a procurar seus pais.
- Acho que sua teoria da CIA não era tão louca, afinal.
- Bom, o amigo do Nick encontrou o nome deles no banco de dados da CIA, mas isso não quer dizer que eles eram espiões. Pode ser qualquer coisa.
- O que quer que seja, acho que dessa vez vão descobrir.
- E ele vai deixar você trabalhar no caso mesmo tendo quebrado a regra nº 10? – eu realmente devia contar tudo, para ele já ter decorado as regras do Tenente.
- Ele avisou que se perceber que o fato deles serem meus pais está atrapalhando meu julgamento, vai me tirar do caso.
- Você vai tirar isso de letra, não se preocupe.
- Eu sei, mas caso eu não consiga...
- Você vai conseguir.
- Rup, caso eu não consiga... – insisti e ele não interrompeu outra vez – Quero que me prometa uma coisa.
- O que quiser.
- Preciso que você me impeça de me afogar nesse caso. Eu nunca quis respostas, é a primeira vez que sinto essa necessidade de saber o que aconteceu. Não sei como vou reagir quando as perguntas começarem a ser respondidas e sei que quando fico frustrada, fico obcecada até conseguir o que quero. Não me deixe afundar.
- Minha mão sempre vai estar aqui pra puxar você de volta, não se preocupe – ele ficou de pé e me puxou da poltrona para um abraço – Você vai ficar bem.
- É... Espero que sim.

Deitei a cabeça em seu ombro e não consegui impedir que um suspiro escapasse, porque por mais que eu quisesse acreditar que tinha tudo sob controle, no fundo eu sabia que estava prestes a começar algo que ia levar até o fim, custe o que custar.