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Posted: terça-feira, 2 de julho de 2013 by Clara Storm Lupin in
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Outubro de 2019
O barulho do bipe alto e insistente me acordou e derrubei
tudo que tinha na mesa de cabeceira na tentativa de pegá-lo. Minha cabeça doía horrores
e o movimento brusco que fiz para me sentar e ver o que tinha no visor dele fez
todo o quarto girar. Maldita despedida de solteiro de Emma, havia perdido a
hora e estava atrasada para o plantão. Dra. Torres ia me matar.
Não tive tempo de tomar banho, vesti a primeira roupa que
encontrei no armário, peguei meu jaleco pendurado na cadeira e aparatei em um
beco próximo ao John Radcliffe, não teria tempo de usar o metro hoje. Olhei no
relógio enquanto corria desesperada para o hospital e vi que já estava mais de
uma hora atrasada. Ela realmente ia me matar, mas não seria a única. Assim que
pus os pés no saguão, esbarrei em minha mãe. Droga! O que ela estava fazendo na
emergência?
- Você está chegando agora ao hospital?
- Eu perdi a hora, ontem foi a despedida de solteiro da Emma
e-
- Artemis também estava na festa e está aqui desde as 7h –
ela me cortou – Ela trabalha o dobro de você, tendo também o estágio no
Ministério e os deveres com o Clã e nunca se atrasa. E eu, que passei pela
faculdade grávida do seu irmão e depois tendo um bebê em casa, nunca cheguei
atrasada a um plantão.
- Desculpa mãe, isso não vai mais se repetir.
- É melhor que não.
Ela saiu andando pelo corredor sem falar mais nada e fiquei
parada sem saber se socava uma parede ou procurava a Dra. Torres. Optei por
procurar minha Atendente, visto que já estava encrencada o bastante. Encontrei JJ
e Arte parados do lado de fora na saída da emergência e só então lembrei que
hoje deveria ser o dia que começava minha rotação com os paramédicos.
- Clara, o que houve? – Arte perguntou preocupada quando me
aproximei.
- Não ouvi o relógio despertar, o que eu perdi?
- Torres está furiosa, Justin teve que ir em seu lugar com
os paramédicos porque eles não podiam esperar você chegar.
- Droga! E agora? Vou ficar mais 21 dias na emergência?
- Fique feliz se sobreviver a Dra. Torres hoje – JJ falou –
Você está com uma cara péssima.
- Obrigada. Nunca mais bebo margaritas.
- LUPIN, o plantão começou às 7h! Onde diabos você estava? –
Dra. Torres gritou do meio do corredor e me lançou um olhar tão furioso que se
fosse feito de laser eu estaria morta. – Não responda, não me interessa. Fará plantão
dobrado hoje.
- Dra. Torres, eu perdi o começo da rotação com os
paramédicos, o que devo fazer? Começo amanha?
- Não, Silverhorn fará a rotação esse mês. Amanhã você começa
na Obstetrícia.
- O que? Mas eu nem me inscrevi pra ela ainda!
- Sua mãe acabou de solicitar seu traseiro sob o comando
dela a partir de amanhã e eu gosto muito da Dra. Storm, não podia negar um
pedido desses – ela me olhou com um sorriso sarcástico no rosto, quase maldoso,
antes de continuar – E se você acha que eu sou ruim, espere até amanhã .
- E quanto a nós, Dra. Torres? – JJ perguntou receoso.
- Hoje vocês estão comigo, amanhã você começa a rotação na Pediatria
e Chronos começa na Psiquiatria.
Ia reclamar, queria protestar por ser jogada para uma rotação
que ainda não queria mesmo que isso levasse a outro esporro, mas o barulho de
uma ambulância entrando no pátio me interrompeu. O que foi bom, porque Arte já
estava me olhando com cara de pavor, implorando sem usar palavras para que eu
calasse a boca. As portas da ambulância abriram e Justin saltou de dentro dela
puxando uma maca. Nela tinha um homem desacordado e a outra paramédica vinha ao
lado, seu braço quase pela metade dentro da barriga do homem. Nós três arregalamos
os olhos e o grito da Dra. Torres nos chamando nos trouxe de volta a realidade.
- Cohen, quero todo o histórico médico desse homem na minha
mão em um minuto! – gritou com JJ e ele assentiu, saindo correndo até a mulher
que berrava enlouquecida no fundo da ambulância – Chronos, reserve uma sala no
centro cirúrgico imediatamente! – e Arte correu em disparada hospital adentro.
- O que eu faço, Dra. Torres? – perguntei atordoada, o braço
daquela mulher dentro do homem estava tirando minha concentração.
- Você me acompanha – respondeu ríspida e olhou para Justin –
Silverhorn, por que essa paramédica está com a mão dentro do meu paciente?
- Eu a aconselhei a não fazer isso, Dra. Torres – Justin se
defendeu.
- Ficha?
- James Carlson, 46 anos, o encontramos inconsciente e
sangrando. Os mecanismos do ferimento são desconhecidos, mas ele tem um ferimento
de sucção grande no peito e uma esposa com pulmões muito saudáveis.
- Sinais vitais?
- Taquicardia nos 140s. Pressão sanguínea estável nos 90s.
- Minha mão foi a única coisa que parou o sangramento – a paramédica
se defendeu – Posso tirar agora?
- Você está com seu dedo em um grande sangramento e o Sr.
Carlson está ficando sem tempo. A única coisa que pode fazer agora é uma viagem
para a sala de cirurgia. Dra. Lupin, prepare-se para transportá-lo até o Centro
Cirúrgico.
- O que você quer que eu faça, Dra. Torres? Já que não vamos
voltar à ronda agora.
- Ajude Cohen a fazer aquela mulher parar de gritar e nos
dizer o que diabo aconteceu!
Justin assentiu e correu para longe do caminho para onde JJ
estava tentando, em vão, se comunicar com a esposa do Sr. Carlson. Os gritos
dela podiam ser ouvidos em toda a emergência e fiquei feliz por entrar no
elevador.
Arte já havia reservado a sala no Centro Cirúrgico e nos
esperava com a equipe para começar a operação quando chegamos. Nos lavamos na
sala de preparação e já estávamos prontas para começar quando a porta da sala
se abriu com violência e um Justin pálido entrou, chamando a Dra. Torres. Eles conversaram
em voz baixa por alguns segundos e logo o semblante no rosto da Dra. Torres
mudou. Ela se virou para a equipe e se dirigiu à paramédica com a mão dentro do
homem com uma calma que eu ainda não havia testemunhado.
- Você, como se chama?
- Susan. Por quê?
- Susan, o ferimento em James Carlson entrou-e-saiu?
- Não, só foi de entrada. Sem saída. Por quê?
- Susan, quero que me diga o que você sente dentro do Sr. Carlson.
O que a sua mão está tocando?
-O que você quer dizer?
- A sua mão está tocando alguma coisa dura? Como metal.
- Eu... Não sei – ela ameaçou mexer a mão e vi a Dra. Torres
perder a cor.
- Não mexa a sua mão. Só me diga o que você sente.
- Dra. Torres, o que está acontecendo? – perguntei já pressentindo
que algo muito ruim.
- Susan? – ela me ignorou.
- A ponta do meu dedo está tocando alguma coisa meio dura.
- Oh, meu Deus – Arte exclamou e tapou a boca com as mãos.
-O que? O que está errado? – Susan começou a entrar em pânico.
- Susan, eu quero que você fique imóvel. Não mexa nem a mão, nem o seu corpo, nem um
centímetro.
- Você deveria saber que está começando a me assustar.
- Não fique assustada .Tudo vai ficar bem.
- Dra. Chronos, você poderia vir até aqui? – ela chamou Arte
na porta da sala – Eu quero que você saia dessa sala - ande, não corra – e vá
dizer a enfermeira encarregada que nós temos um Code Black. Diga a ele que eu
tenho certeza, e também para chamar o esquadrão anti-bombas.
Artemis assentiu e saiu depressa da sala, mas por mais que
eles tenham falado baixo, todos havíamos ouvido a parte do esquadrão anti-bombas.
Houve um pânico inicial na sala, mas a Dra. Torres manteve a calma e pediu que
todos se retirassem, lentamente, ficando apenas ela e Susan, que estava
assustada, mas mantinha a mão imóvel. Só que eu fiquei. Não sei explicar o
motivo, mas não conseguia me mover. A garota era só um pouco mais velha que eu
e estava aterrorizada, sentia que precisava ficar ao lado dela.
E meu instinto se provou certo. Pouco antes do esquadrão anti-bombas
chegar Susan entrou em pânico. Começou a dizer que ia tirar a mão, que era
jovem demais para morrer, e Justin, JJ e Arte entraram correndo na sala para me
ajudar a acalmá-la. Ela ficava cada vez mais descontrolada e chorava
copiosamente, e então tudo aconteceu rápido demais. Até hoje digo que foi meu
instinto de lobo que nos salvou. Susan puxou a mão de dentro do corpo do Sr. Carlson,
correndo sala afora, e todos se atiraram no chão, mas nada aconteceu. Quando
olhei para baixo, estava com a mão dentro dele, segurando a bomba.
O pânico era visível no rosto de todos eles, mas não havia nada
que pudéssemos fazer. O esquadrão anti-bombas finalmente chegou e Otter era o líder
da equipe. Era bom ter alguém em quem confiava no comando daquela situação. Ele
colocou todos para fora, deixando apenas a Dra. Torres e eu na sala. Ela, para
ventilar o Sr. Carlson que precisou ser desligado da máquina por causa do fluxo
de oxigênio, e eu por motivos óbvios. Depois trouxe o aparelho móvel de Raio-X
para que pudéssemos saber com o que estávamos lidando. Mamãe apareceu no
corredor em pânico, mas ele a acalmou e ela não teve alternativa senão se
afastar. Ótimo. Se eu explodisse, minha ultima conversa com ela teria sido uma
briga.
- Então... Eu estou tocando agora em uma munição que não
explodiu? – perguntei depois que ele explicou brevemente a situação.
- Eu receio que sim.
- Não é o melhor sentimento do mundo.
- Eu acho que não. O dispositivo é feito a mão, o que
significa que é instável e muito difícil de confiar. Pode ser uma bomba
falhada, mas não temos como saber.
- Quem constrói uma bazuca e atira no outro? – perguntei tentando
descontrair
- As pessoas não param de nos surpreender com a sua
estupidez. Como isso que você fez. Você tem noção o quão estúpido foi isso?
- Incrivelmente estúpido – Dra. Torres completou.
- Certo, já entendi – disse impaciente – Então você tem um
plano, certo? Você realmente vai me tirar dessa, não é?
- Sim, prima, não se preocupe. Eu sou o cara.
Otter abriu um sorriso, aquele sorriso carismático que não combinava
nem um pouco com o cargo que ele ocupava como líder do esquadrão anti-bombas e
que conquistava qualquer um, e calmamente me explicou qual era o tipo de bomba
que eu estava segurando e todo o procedimento para que ela fosse retirada com
segurança. Depois explicou para a Dra. Torres que ela poderia operá-lo assim
que a bomba estivesse em suas mãos.
- Certo. Vamos revisar de novo.
- O dispositivo tem o formato de um foguete. Tem
aproximadamente 20 cm de comprimento – repeti o que ele havia dito.
- E a minha equipe estará a postos. Então eu vou segura o
dispositivo com firmeza e puxe-o para fora lentamente.
- Mantendo-o no mesmo nível – completei e ele assentiu.
Otter saiu da sala alguns minutos e podia ver que estava
falando no rádio com o resto de sua equipe. Só ele estava próximo da sala, os
outros membros estavam no afastados no final do corredor. Vi ele assentindo
algumas vezes e então voltou.
- Nós estamos prontos.
- Clara? – Dra. Torres me chamou – Eu vou abrir o ferimento.
Quando eu cortar, o sangramento vai fica intenso. Se nós vamos salvar o Sr.
Carlson, Você tem que tirar a munição imediatamente.
- Mas lembre-se, remova-o mantendo-o no mesmo nível possível
– Otter lembrou e assenti – Com calma e devagar, sem movimentos rápidos.
- Certo, no nível.
- Você está pronta?
- Eu tenho alguma escolha?
- Você tem que estar pronta.
- Eu acho que estou pronta.
- Certo, vamos lá. Coloque a sua mão ao redor do nariz do
cone.
- Hiro, ele acha que nunca vou me casar com ele – disse de
repente.
- Clara?
- Não é verdade, eu adoraria me casar com ele, mas não agora
nem tão cedo. Não estou pronta. Pode dizer isso a ele?
- Clara, você vai ficar bem, pode dizer você mesma.
- Não, você tem que me garantir que vai dizer isso a ele! –
minha voz estava saindo do controle, eu estava em pânico.
- Ok, tudo bem, eu digo a ele.
- Eu-eu não posso. Não. Eu não posso. Isso é loucura. Dra.
Torres, você precisa ir embora. Vocês dois devem ir. Você vai se casar essa
semana.
- Ninguém vai morrer hoje, Lupin.
- Clara, eu quero que você olhe pra mim. Eu sei que é ruim. Isso
é um saco, mas você não vai morrer. Mas você precisa me ouvir.
- Estou com medo
- Eu sei. Mas você pode fazer isso. Vai acabar em um
segundo.
- Tudo bem.
- Certo. Então vamos lá. Devagar – Otter se aproximou mais e
comecei a mover a mão lentamente – Isso, muito bem, só mais um pouco.
Puxei a mão toda para fora e fazendo um esforço enorme para não
tremer, entreguei a bomba na mão dele. “Você se saiu bem” foi a última coisa
que ele disse antes de sair da sala, ainda com aquele sorriso contagiante no
rosto me encorajando. Assim que ele saiu a Dra. Torres começou a operar o Sr.
Carlson e meu corpo inteiro começou a tremer, nem que ela tivesse solicitado
minha ajuda eu seria capaz de fazer alguma coisa. Graças a Merlin nos minutos
finais Otter tinha autorizado a entrada da chefe das enfermeiras e do
anestesista.
Ainda tremendo, caminhei até a porta da sala para ver meu
primo caminhando com a bomba pelo corredor, mas assim que pus os pés do lado de
fora e vi Otter de costas, uma explosão ensurdecedora fez todo o andar tremer e
me lançou para trás. Minha cabeça bateu no chão com a força do impacto e
apaguei.
N.A.: Trechos de diálogos
retirados de Grey’s Anatomy, “It’s the end of the world” e “As we know it”.