Posted: quinta-feira, 20 de dezembro de 2012 by Nicholas O'Shea in
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- Ei O’Shea, a quanto chegou o carro hoje? – um dos detetives perguntou quando voltei para a delegacia.
- 130km/h! – respondi com um sorriso satisfeito – Cara, eu adoro perseguições.
- Seu maldito sortudo! – ele bateu nas minhas costas e o capitão saiu da sala.
- Bom trabalho, O’Shea.
- Obrigado chefe, mas ainda não acabou. Ele ainda precisa ser fichado na central e encaminhado pra prisão pra aguardar julgamento.
- E o que está esperando para fazer isso?
- Só vim buscar os papéis.
- Ótimo, deixe tudo na minha mesa quando terminar.

Assenti pegando a pasta que precisava e voltei para a central de fichamento, onde sempre ficava um novato responsável por fichar os presos que trazíamos, mas desse cuidei eu mesmo. Foi uma manhã longa preenchendo toda aquela papelada, mas quando o preso tinha que ir para Azkaban sempre dava mais trabalho. E eu fazia questão que ele ficasse confinado lá, sob a vigília dos Chronos, porque só assim eu tinha a certeza de que ele não conseguiria fugir.

Nigel já havia mandado as balas que o médico legista retirou dos corpos junto da arma que arranquei da mão de Jason para o teste de balística e o resultado chegou no inicio da tarde. Aquela havia mesmo sido a arma usada nos dois assassinatos. Jason nunca mais iria sair de Azkaban.

Dois guardas do Clã Chronos que ficavam em Azkaban vieram buscá-lo por volta das 16h e a partir do momento em que entreguei Jason a eles, ele não era mais minha responsabilidade. Seu destino agora estava nas mãos da Suprema Corte Bruxa e do advogado que ele contratasse para tentar livrá-lo dessa, embora eu duvidasse que conseguisse. Brianna estava saindo do elevador quando os guardas entraram com Jason e ela lançou um olhar para ele que era uma mistura de desaprovação e pena antes de virar o rosto e sair do caminho.

- Ele vai pra Azkaban? – ela perguntou reconhecendo o uniforme dos guardas.
- Sim, ele é bruxo e vai ser julgados pelas nossas leis, então vai ficar em uma prisão bruxa.
- E uma que não tem como escapar – ela completou com um suspiro cansado – Ótimo, não quero que essas crianças tenham qualquer contato com ele outra vez.
- Onde elas estão? Não tive tempo de falar com eles ainda.
- Na sala de descanso, preciso resolver só mais uma coisa antes de levá-las. Pode dizer isso a elas, por favor? Não vou demorar.

Ela saiu apressada na direção das escadas e caminhei até a sala de descanso. Capitão Cragen estava agachado conversando com as crianças quando entrei e a cena me surpreendeu. Sei que ele tem filhos, acho que já tem até um neto, e com certeza sabe lidar com crianças, mas é sempre estranho ver a figura que representa autoridade e é sempre tão séria mostrando outro lado. Ele levantou quando entrei e Molly veio correndo na minha direção, agarrando minha perna.

- Oi baixinha – puxei-a para o meu colo e ela deitou a cabeça em meu ombro, tímida, mas com um sorriso enorme no rosto – Ei Austin, você cresceu bastante desde a última vez que nos vimos.
- Ele já tem seis anos – Molly levantou a cabeça já abandonando a timidez – E eu já fiz quatro!
- Você também está grande, mas continua baixinha – brinquei e ela riu, se contorcendo quando fiz cócegas em sua barriga e deslizando até o chão.
- Ela ainda é um bebê – Austin provocou.
- Não sou um bebê! – ela respondeu de volta, braba.
- Você vai ser sempre meu bebê – ele agora não tinha um tom de voz provocativo e ela não revidou – O que vai acontecer com a gente?
- Brianna já está vindo buscá-los, ela não vai demorar. Vai levar vocês a um lugar seguro.
- Não vamos mais morar com o Sr. e a Sra. Fisher? – Molly perguntou confusa, olhando para Austin em busca da confirmação do irmão – Mas eu gosto deles.
- Eles não podem mais cuidar da gente, eles foram pro céu – Austin respondeu e ela o abraçou, ameaçando chorar.
- Mas Sarah prometeu que ia cuidar da gente pra sempre.
- Os adultos não cumprem promessas, mas eu nunca vou abandonar você, Molly – ele a segurou firme, outra vez tão sério que não parecia ter só seis anos – Não importa o que acontecer, vai ser sempre você e eu.
- Você promete que não vai ficar longe de mim?
- Nunca. Você é minha irmãzinha e o meu dever é cuidar de você.
- Ei, não é assim também – agachei para ficar na altura deles e Austin me olhava sério – Adultos cumprem promessas sim, mas às vezes demoram mais do que pretendiam. E eu sei que eu fiz uma promessa a você que ainda não cumpri, mas não esqueci.
- Não me importo – ele deu de ombros tentando soar indiferente, mas estava estampado em seu rosto o quanto ele precisava que algo fosse cumprido.
- Mas eu me importo, porque eu sempre cumpro as minhas promessas – puxei o celular do bolso e encontrei o numero de Rupert na discagem rápida. Ele atendeu no primeiro toque – Ei primo, está ocupado? Não, não é sobre isso, mas você pode passar aqui na delegacia? Lembra daquele menino que falei que ia apresentar a você? Ele está aqui e não acha que vou cumprir o prometido. É, ele mesmo. Espero você aqui.
- Pra quem você ligou? – Austin perguntou assustado, sem acreditar que eu fosse mesmo cumprir a promessa.
- Rupert Storm, ele está a caminho. O Harry vai ficar pra depois, ok? Ele não está em Londres.

Ele ainda estava no centro de Londres quando liguei e chegou dez minutos depois. Era difícil descrever a expressão no rosto dele, mas acho que um pouco do trauma de hoje foi esquecido, ao menos naquele momento. Deixei Rupert - que depois de dois livros já estava mais do que acostumado a lidar com crianças - conversando com eles e fui procurar Brianna. Ela estava saindo do elevador outra vez quando a encontrei.

- Está tudo pronto, vou levar as crianças para o meu abrigo. Consegui uma autorização para eles morarem conosco até encontrarem uma nova família.
- Eu quero adotar eles – disse de repente e ela se assustou – O que preciso fazer? Acha que consigo a guarda deles? Sei que nenhum juiz vai autorizar isso se continuar tendo dois empregos, mas eu saio da banda e fico só com o cargo de detetive.
- Wow, calma! É muita informação em poucos segundos! Que história é essa de sair da banda? Ficou maluco? Não pode tomar uma decisão dessas de repente!
- Não é uma decisão de impulso, já venho pensando nisso tem tempo, acho que só precisava de um incentivo maior. E é isso, esse era o empurrão que eu precisava para criar coragem de fazer isso.
- Nick, você está falando sério? Quer mesmo sair da banda e adotar essas crianças?
- Sim, quero. Eles precisam de mim e eu preciso deles. Meu pai deixou os Duendeiros para cuidar de mim e agora é a minha vez de fazer o mesmo.
- Você não sabe o quanto eu estou orgulhosa de ser sua amiga! – Brie me abraçou – Pode contar comigo no que precisar, vou fazer tudo que estiver ao meu alcance para ajudar.
- Então acha mesmo que consigo?
- Não vai ser fácil. Você é solteiro e ainda é homem, não é exatamente a combinação que eles procuram, mas o fato de você querer adotar os dois juntos e eles já conhecerem e confiarem em você conta muito. É difícil, mas também não é impossível.
- Certo. Então acho que a primeira providencia que preciso tomar é avisar ao resto da banda sobre os meus planos.
- Definitivamente.  Conte a eles hoje e amanhã começamos a trabalhar nisso.
- Você é a melhor! – dei um beijo na bochecha dela e sai correndo atrás de Nigel. Precisava de uma reunião de emergência ainda naquela noite.

°°°°°°°°°°

Becky já estava em sua terceira caneca de café – havia saído de um turno de 24h no quartel – quando Otter finalmente chegou. Já estávamos no meu apartamento apenas esperando por ele e todos curiosos com o motivo da reunião repentina.

- Desculpem o atraso, estava repassando as perguntas do caso da bomba no hospital com o comandante. O que eu perdi?
- Só a Becky acabando com o estoque de café do Nick – Nigel respondeu rindo.
- Eu estou sem dormir a 24 horas, me deixem em paz.
- Ok Nick, estamos todos aqui, qual é o assunto urgente que não podia esperar até o fim de semana?
- Bom, não há um meio de fazer isso ser mais fácil, então vou direto ao ponto – sentei no sofá na frente deles e os quatro me olhavam intrigados – Ano que vem entrarmos no nosso ano de pausa dos Orcs que combinamos, mas quando a banda voltar em 2020, eu não volto com vocês. Estou saindo.

A sala ficou em silêncio. Ninguém falava nada, apenas trocavam olhares que eu não conseguia decifrar. Por mim Nigel começou a rir e Otter soltou um palavrão, puxando a carteira do bolso e entregando uma nota de 100 euros para o irmão.

- Vocês apostaram que ele ia sair? – Connor perguntou surpreso, mas Becky estava rindo também.
- Como vocês sabiam? – perguntei não achando muita graça também.
- Nick, nos conhecemos desde que tínhamos o que? Seis anos? Acho que já sei perceber quando algo está errado e você tem andando distante já faz algum tempo. De todos nós, eu sou quem o conhece melhor porque trabalho com você o dia inteiro.
- Não acreditei muito quando ele me disse que achava que você ia sair da banda eventualmente, então apostei que estava errado.
- Podemos saber o motivo? – Connor perguntou.
- Porque eu estou cansado. Vocês entendem melhor do que ninguém o que é fazer shows, dedicar tanto tempo aos ensaios, e ao mesmo tempo ter turnos de 48 horas no quartel ou na delegacia e não ter tempo para mais nada. Vocês ainda conseguem isso, mas eu não. Pensei por muito tempo sobre isso, mas não sabia de qual precisava abrir mão, até hoje.
- Está falando do caso das crianças North? – Nigel perguntou confuso e assenti – O que isso tem a ver com você escolher entre a banda e a delegacia?
- Por que eu vou adotar eles e trabalhando só na delegacia consigo tempo para cuidar deles.

Dessa vez não houve silencio porque Nigel engasgou com a cerveja que bebia e Otter começou a bater em suas costas para ajudar. Connor parecia em estado de choque, mas Becky abriu um sorriso enorme.

- Cara, você precisa aprender a amenizar suas noticias – Connor comentou voltando a respirar.
- Nick, você está falando sério? – Becky perguntou me encarando ainda sorrindo.
- Sim, estou. Sei que não vai ser fácil, mas também sei que posso fazer isso.
- Uau, acho que vou entrar em depressão – Otter se largou no sofá – Nick vai ser o primeiro de nós a ser pai?
- Não é? Sempre achei que seria o Nigel! – Connor comentou e Nigel olhou de cara feia.
- Até onde sei, ele pode ter vários filhos espalhados pele mundo que não sabemos – disse rindo e ele me atirou uma almofada.
- Não diga isso, pode atraí-los até aqui!
- Se alguém tem que ficar deprimida aqui, esse alguém sou eu que já casei! – Becky caminhou até o meu lado, agarrando meu rosto e beijando minha bochecha – Mas estou é muito feliz por você, primo. E orgulhosa de ver que finalmente cresceu.
- Vocês não estão chateados? – perguntei incerto olhando para Connor.
- Como podemos ficar chateados por você querer adotar duas crianças e ter sua própria família? – ele respondeu finalmente sorrindo – Estou orgulhoso também.
- É cara, estamos todos felizes por você – Otter levantou também e bateu em minhas costas – E pode contar conosco no que precisar.
- É, porque você vai precisar de ajuda pra conseguir a guarda dessas crianças – Nigel olhou em volta – Esse apartamento é uma bagunça!
- Está bagunçado porque só chego aqui pra dormir, mas isso acaba ano que vem.
- Gente, se o show do dia 30/12 vai ser o último do Nick, temos que fazer algo especial – Connor comentou e todos assentiram.
- E quero você nele, Becky! – disse apontando para ela.
- Estarei lá, não se preocupe.
- Cara, o Banks vai ficar uma fera!

Nigel imitou a previsível reação do nosso produtor e começamos a rir já imaginado como seria tenso o momento em que eu contasse a ele dos meus planos para o futuro. O resto da noite foi ocupada com planos sobre como transformar o antigo quarto de Connor em um lugar adequado para duas crianças e idéias para o nosso último show juntos, na véspera do ano novo. Se aquele seria o meu último show, então teria que ser épico.

O que não sabíamos naquele momento era que aquele show épico seria o último dos Orcs.

Posted: sábado, 15 de dezembro de 2012 by Haley McGregor Warrick in
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“Não é  necessário ser uma câmara para ser assombrado, não precisa ser uma casa. O cérebro tem corredores que superam o lugar material.”
Emily Dickinson

Final de novembro de 2017, Rede de Flú, Ministério da Magia, Londres.

Quando voltei da temporada de jogos, optei por viajar pela rede de pó de Flú, pois estava cheia de sacolas e não queria perder nada durante a aparatação, afinal eu já havia começado as compras de Natal.
Quando saí das chamas esverdeadas de uma das muitas lareiras do Ministério da Magia em Londres,  vi Justin me esperando com um sorriso no saguão, soltei tudo no chão, enquanto ele me puxava, me abraçando apertado.
- Que bom que você voltou! – ele disse depois de me beijar, com a testa encostada na minha.
- Eu sempre volto para você.Você não está de plantão hoje? - respondi após aspirar seu cheiro que fazia com que eu me sentisse em casa. Ele me ajudou com as sacolas e enquanto procuravamos uma área para aparatar ele disse:
- Hoje não, só amanhã de manhã, por 48 horas. Quanto tempo você tem?
- Estou de folga por uma semana.- percebendo que ele não ficou tão animado quanto eu esperava,  olhei-o nos olhos e ele explicou:
- Seu irmão, Ethan me procurou depois que você viajou, precisa de nossa ajuda com uma criança que está no abrigo.
- Pobrezinha. É muito ruim?- eu quis saber e ele disse sério:
- Orfã de dez anos, que não se adapta a lugar algum pois já passou por muita ruim, tem medo de pessoas em geral, especialmente do sexo masculino, crises histéricas e pesadelos. O pouco que pude fazer por ela, foi enfeitiçar um apanhador de sonhos e parece que ela tem dormido melhor.
- Não é que eu não queira ajudar, mas não seria um caso para um psicólogo ou terapeuta? – e ele me encarou antes de me abraçar para aparatarmos:
- Ela é uma criança trouxa que vê gente que morreu, Haley.

-o-o-o-o-o-o-o

Deixei Justin no St. Mungus, e aparatei até o vilarejo, onde estava localizado o abrigo criado por meu irmão. Como era um local seguro, você só conseguia localiza-lo, quando o dono te dava o endereço enfeitiçado. Foi uma precaução extra, para proteger as hóspedes, depois de um incidente sério, dois anos antes, com o ex marido de Gwen, a administradora do abrigo.
A casa, que já era de bom tamanho, havia sido ampliada, com mais salas de recreação, tv, sala de estudos e de música. Sabia que Nick e Edward davam aulas de música para as crianças, e que Ethan e Brianna, com a ajuda de Gwen tornavam o lugar acolhedor e seguro para vítimas de violência doméstica. Cheguei na hora em que as crianças estavam indo para a escola mista do vilarejo, e Parker, o filho caçula de Gwen com 7 anos, veio correndo em nossa direção, seguido de seus irmãos. Havia outros dois com eles, que preferiram se manter afastados, e junto deles em guarda estava Bóris, o pastor alemão, que havia sido adotado pelo abrigo, quando se aposentou na força policial.
- Haley! Haley! Você veio.- e me abraçou apertado, e ri da sua empolgação, enquanto cumprimentava seus irmãos mais velhos: Grayson e Emma.
- Eu disse que vinha, não? E trouxe o que prometi: é sua! peguei da minha mochila, uma goles autografada pelo meu time de quadribol, dei a eles os presentes que eles pediram,  embora fossem trouxas: uniformes do Pride, que mandei personalizar com os nomes deles.
- Quando vocês voltarem da escola, jogamos um  pouco.-  eles assentiram e depois de se despedirem da mãe, foram para a escola, acompanhados por Cassandra Cooper, a segurança do abrigo. Eu a conheci quando ela participou de um dos treinamentos de defesa pessoal, ministrados por minha mãe para a família. Sim, dona Alex ainda fazia isso, e depois do que passei no último ano, acho até bom me manter atualizada. Acenei e ela retribuiu, sorrindo, porém sem perder seus protegidos de vista.
- Oi Haley, vamos entrar e tomar alguma coisa.- disse Gwen e eu quis saber:
- A outra garota... Izabel não vai à escola?
- Não, ainda não consegue, mas ela me parece muito inteligente. Notei que alguns livros sumiram da biblioteca e hoje ela se recusou até mesmo a tomar o café da manhã. Estamos muito preocupados, ela tem se alimentado pouco.
- Eu sei. Justin também está preocupado com ela. Ethan e Brie me falaram sobre a situação dela e eu acho que posso ajudar. – ela me olhou séria por alguns segundos e disse:
- Mas você é uma atleta, o que poderia fazer? Oh! Sim! Acho que entendi...Sabe que ainda fico espantada com as coisas em seu mundo?- disse corando e comentei:
- Isso vindo de alguém que namora um bruxo, que é um promotor que faz muito marmanjo chorar na corte? - rimos juntas enquanto entrávamos na casa.
- Como vão as coisas com Declan? – perguntei e ela
- Vão muito bem, ele é maravilhoso e nem preciso dizer que sou apaixonada por Liam. – fomos conversando e cumprimentando as pessoas que encontravamos pelo caminho, até o quarto onde Izabel estava hospedada, o qual foi fácil de achar: era o único enfeitado com um apanhador de sonho. Toquei-o e ele irradiou calor para minha mão. Sabia que Justin, como curandeiro, havia feito o melhor para ajudar aquela menina. Gwen bateu na porta e depois que foi autorizada a entrar, ela disse:
- Izabel, você tem uma visita. É  irmã do Ethan, Haley que gostaria de conversar com você. Tudo bem?- um murmúrio de aprovação foi ouvido e ela se afastou para eu seguir em frente, mas eu disse a ela antes de entrar:
- Gwen, haja o que houver, não deixe ninguém vir aqui ok? Tomarei conta de tudo.- ela assentiu preocupada e eu passei pela porta.
Não pude conter um suspiro de pesar pelo que eu vi. O quarto era simples, com uma cama de dossel, e ao redor dela haviam lençóis brancos pendurados, formando uma tenda e me olhando através de uma fresta, havia um rosto muito pálido, com olhar tenso e vigilante. Sorri e ela me olhava desconfiada, forçando a vista, talvez tivesse duvidas, se eu estava viva ou não. Olhando ao redor do quarto, pude entender o porque ela tinha tanto medo. Aquele lugar me lembrou uma estação de trem, na hora do rush. Havia espíritos de fantasmas com aparências assustadoras: mutilados, ensanguentados, alguns com roupas de hospital, outros que pareciam ter sofrido algum acidente...Alguns suplicantes e outros com olhares malignos, que me olhavam desafiantes e ficavam afastados rente às paredes.  
- Olá, eu sou Haley, meu irmão Ethan é o dono daqui e ele me pediu para que eu conversasse com você, sobre os fantasmas.- e ela abriu o vão da tenda um pouco mais.
- Você quer entrar? Aqui é seguro e eu tenho biscoitos.- e ao meu olhar curioso, ela disse rápido:
- Eu não os roubei, foi Parker quem me deu, antes de ir para a escola.- meu coração doeu.
- Parker é um dos garotos mais legais que conheço. Assim como Grayson e Emma, você não acha?- ela fez que sim com a cabeça e eu continuei falando:
- Quando eles voltarem da escola vamos jogar um pouco lá fora e se você quiser poderá vir conosco.- disse enquanto entrava na tenda e ela a fechava rapidamente, se afastando de mim. Olhei para cima e entendi o porque ela ficava lá: havia outro apanhador de sonhos pendurado no alto.A tenda funcionava como um casulo onde nenhum espirito poderia entrar.- ela viu meu olhar e disse rápido, com sua voz ficando mais forte a cada minuto:
- Eu ganhei do Justin, amigo do doutor Ethan e da Brie, ele disse que ia me proteger dos sonhos ruins, você o conhece? Sabia que eles são bruxos bons, e não são como os warlocks que passam na tv? E eu acho que Brie parece uma fada, mas ela disse que é uma bruxa boazinha.... Você sabe magia?  – sorri assentindo e agradecida de que ela já havia sido esclarecida sobre o nosso mundo e parecia reagir bem.
- Sim, conheço Justin. Ele é meu namorado e eu também tenho um destes em casa. Me ajuda muito quando preciso dormir, sem nenhum espírito invadindo meus sonhos, e pedindo ajuda.Fica difícil se equilibrar numa vassoura, quando seus olhos estão ardendo de sono. – ela me olhou espantada:
-  Você..Você sabe...
- Sim, eu sei o que você vê, isso acontece comigo desde pequena, e por isso eu vim para te ajudar.
- Mas ninguém pode fazer nada, eles dizem que ninguém pode. Todos são maus, porque eu sou esquisita.
- Wow, nós não somos esquistas ok? Conheço gente esquisita e eles não são como nós, te garanto.- disse jogando o cabelo para trás de forma afetada, e ela esboçou um sorriso. – e continuei:
-  Os espiritos que estão por aqui precisam de ajuda para seguir a luz, e geralmente é porque eles deixaram algo para trás, que precisa ser resolvido. Nem sempre você vai conseguir ajudar, mas fará o seu melhor.
- Mas eu não posso ajudar, tenho medo.
- E eles também têm medo de você. Imagine estar no lugar deles, onde ninguém pode ouvi-los e quando aparece alguém especial,que pode vê-los,  eles ficam desesperados por ajuda e nem sempre são compreendidos, e acabam assustando-a sem querer. Na maioria das vezes, eles só querem saber que vai ficar tudo bem, por isso procuram gente como nós, os mediadores. – como ela me olhasse desconfiada, eu disse:
- Vou te mostrar.- abri a tenda e ela soltou um grito de medo, e enquanto eu saía da tenda e encarava cada um dos espíritos ali presentes e eles iam falando sobre suas queixas e alguns até davam os recados aos parentes, que eu anotei num caderno que encontrei numa mesa. Sabia que ela estava acompanhando tudo através da fresta no lençol.Após algum tempo, eu disse:
- Estou precisando de ajuda aqui, Izzie, será que você pode vir me ajudar a mostrar a estas pessoas que elas precisam ir embora? Eu te protejo.- e ela me olhou séria:
- Sim, eu sei que você vai me proteger, as luzes brancas e azuis que rodeiam você, os repele. Foi a mesma coisa com o Justin...Sabe, doutor Ethan e Brianna são banhados em rosa e verde. São auras, eu já li sobre isso. - Não pude deixar de pensar, que se ela algum dia receber alguma carta de Hogwarts, acabará indo para a Corvinal. Que desperdício!  
Ela ficou ao meu lado, ouvindo os fantasmas, e percebi que fazia anotações em uma letra caprichada. Ficamos por ali muito tempo, pois ouvi o barulho dos latidos do cachorro.
- Os outros voltaram da escola...-ela disse enquanto eu ouvia seu estômago roncar. Ela ficou embaraçada e eu convidei:
- Gostaria de descer comigo e almoçar? Pode conhecer as outras hóspedes e fazer amigos.
- E se...Não gostarem de mim? – ela perguntou com dúvidas nos olhos.
- Mas porque não gostariam de você?- devolvi a pergunta e ela respondeu:
- Porque haverá menos comida na mesa se eu for lá. Era sempre assim nos outros lugares aonde morei, e eles me odiavam por isso. – segurei as lágrimas e quis saber:
- Por isso você não tem comido junto com os outros? – ela assentiu e eu disse:
- Izzie, escute o que eu digo e é sério: você não precisa se preocupar com a falta de comida, ou com a sua segurança, pois agora você está sob a proteção de meu irmão e ele jamais deixaria algo de ruim acontecer com você, e ele não estará sozinho, pois não só eu, mas todos nós aqui nos importamos. Não hesite em me chamar, sempre que quiser. Se eu estiver fora, a trabalho Justin poderá te ajudar com os fantasmas.- eu estendi a mão e ela a pegou vacilante, selando nossa amizade.
Antes de descermos, arrumei o quarto dela com magia e ela sorria encantada, a ajudei a arrumar o cabelo, e foi até divertido ver o espanto das pessoas quando nos juntamos a eles para almoçar. Gwen, veio falar comigo, enquanto Parker como o bom anfitrião que era, ia apresentando Izzie para todos, e Emma enchia o prato da nova amiga.
- Izabel está bem agora? Conseguirá ser normal como as outras crianças?– fiz que não com a cabeça:
-  Ainda não sei. Hoje foi só o primeiro passo, mas ela ainda vai precisar de muita ajuda, pois ainda tem muito a superar. Mas vamos estar com ela a cada passo da jornada.- Gwen assentiu enquanto olhávamos a a menina tímida e carente, ser paparicada. 

Pena que nem sempre o otimismo ou a fé na bondade, consegue ser uma barreira contra o mal.


Posted: quinta-feira, 6 de dezembro de 2012 by Nicholas O'Shea in
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Londres, setembro de 2018


Já fazia algum tempo desde que havia confessado a Rupert minha vontade de permanecer apenas com uma carreira, mas embora já tenham se passado quase quatro meses nenhuma decisão havia sido tomada. Continuava vindo todas as manhãs para a delegacia e seguindo com os Orcs em turnê à noite, sem ter tempo para mais nada.

Parecia ser um turno típico. Depois de fechar o caso de uma menina desaparecida em menos de 24 horas, o que era sempre um alívio, preenchia meu relatório para entregar ao capitão sem perspectiva de entrar em nenhum outro caso pelo resto do dia quando Rupert entrou na delegacia. Cumprimentou Nigel em sua mesa e se dirigiu até a minha, puxando uma cadeira. Era engraçado ver como os outros detetives e policiais reconheciam Rupert e apontavam. Alguns até se aproximavam para pedir um autógrafo ou uma foto.

- Está perdido ou veio testar sua popularidade entre as autoridades de Londres? – perguntei quando o alvoroço terminou e ficamos sozinhos outra vez.
- Estava a caminho da minha consulta com o Dr. Pace e passei para pedir um favor – disse puxando um pedaço de papel do bolso e me entregando – Você ainda tem aquele amigo no Serviço Secreto?
- Marshall, sim, claro – olhei para o papel e vi que tinham dois nomes anotados – Do que precisa?
- Saber se esses nomes algum dia passaram pela CIA. Como agentes, procurados, qualquer coisa.
- Brennan. Esse não é o sobrenome da Amber?
- São os pais dela.
- Os pais dela tem alguma relação com a CIA? – perguntei surpreso.
- Não sei, podem ter. Ela está estudando o caso deles em uma aula na academia e nada faz sentido. Como duas pessoas podem simplesmente evaporar da face da Terra?
- Ah, a aula do Wes, minha favorita. Ele vai arrancar o couro dela quando souber que escolheu algo pessoal, mas se encontrarem alguma coisa... Talvez ele releve.
- Está difícil encontrar algo.
- Sua teoria da CIA é maluca, mas não é impossível. Ninguém evapora sem deixar rastros, a menos que seja treinado para isso. Vou pedir a Marshall para jogar o nome deles no banco de dados da CIA e aviso assim que tiver um retorno dele.
- Obrigado, Nick – ele levantou e estendeu a mão para mim – Tenho que ir ou vou me atrasar.

Liguei para Marshall assim que Rupert saiu e expliquei o pouco que sabia da história, mas ele ficou intrigado o suficiente para dar uma olhada nos nomes que passei. Voltei à atenção ao relatório que estava fazendo, mas ainda estava longe de terminar quando fui interrompido mais uma vez. Agora era meu celular tocando e vinha de um número restrito.

- O’Shea.
- Nick? – uma voz de criança falou e reconheci de imediato.
- Austin? É você?
- Sim, sou eu – a voz dele saia tremida e aquilo me alarmou.
- Austin, está tudo bem?
- Não. Você pode vir nos buscar?
- O que aconteceu? Onde você está? Sua irmã está com você?
- Molly está aqui. Papai nos levou embora. Eu não gosto daqui, Nick. Quero voltar para casa.
- Onde vocês estão? – estalei os dedos agitado na direção de Nigel e ele correu até minha mesa – Rastreie meu celular – disse a ele colocando a mão para Austin não ouvir.
- Não sei, desculpe. Estamos dentro de uma casa, mas não sei onde ela fica.
- Não tem problema, eu vou encontrá-lo. Você viu alguma coisa na rua quando entraram na casa?
- Uma loja de cupcakes. Molly queria comer um, mas papai não deixou.
- Tem alguma janela onde vocês estão? Você consegue ver a rua por ela?
- Tem uma janela sim, mas não consigo ver direito, estamos em um porão. Acho que tem uma loja de discos do lado de uma farmácia.
- Austin, por quanto tempo seu pai dirigiu com vocês? Vocês pegaram um carro?
- Sim, um carro grande e branco, como uma van. Ele dirigiu por dois episódios de Thomas o trem, Molly estava assistindo no iPad da Sra. Fisher.
- Austin, ele está vindo! – ouvi a voz de Molly ao fundo e barulho de coisas caindo.
- Tenho que desligar, papai está descendo! – e desligou antes que eu pudesse dizer qualquer outra coisa.
- Conseguiu? – perguntei a Nigel, mas ele sacudiu a cabeça.
- Foi mal, irmão. Muito pouco tempo, não consegui a localização exata, mas algo próximo.
- Ele disse que o pai dirigiu por 40 minutos.
- Isso mesmo, o sinal veio de uma torre dentro dessa área – disse apontando para o mapa na tela, que mostrava uma área em Surrey.
- Certo, vou buscar a Brie, isso é caso dela. Vá até a casa dos Fisher ver o que aconteceu. Jason North tirou essas crianças de lá de alguma forma, quero saber como.

Nigel assentiu puxando o casaco da mesa e saindo da delegacia enquanto eu ia avisar ao capitão sobre o que estava acontecendo. Liguei para Brie avisando o que tinha acontecido e ela já estava me esperando na porta do hospital quando parei a viatura. A ligação de Nigel veio antes que andássemos duas quadras no transito. Não estávamos lidando com apenas um seqüestro.

Os corpos de Sarah e Richard Fisher estavam na sala de estar, um único tiro na cabeça de cada um. Eles não tiveram chance alguma. Pelas marcas de sangue no chão, Sarah havia sido baleada quando abriu a porta e seu marido quando apareceu no corredor atraído pelo barulho do tiro. Ele havia arrastado ambos até o meio da sala, deixando um rastro vermelho pelo chão.

A casa estava em perfeita ordem, tudo que Jason queria era levar as crianças e eliminou quem os impedia, não precisava de mais nada. Nigel assumiu o caso do assassinato e decidi cuidar apenas do seqüestro. Se ele já estava em Surrey, podia ir ainda mais longe nas próximas horas e não queria arriscar que Jason descobrisse a ligação que Austin fez.

Com a única informação de uma loja de discos, uma farmácia e uma loja de cupcake na rua, dirigi até Surrey com Brianna. Karpowski ficou coordenando da delegacia e nos dando as direções. Ainda estávamos entrando em Surrey quando outra vez o numero restrito me ligou. Atendi tão afobado que quase derrubei o telefone no chão do carro.

- Nick, ele vai nos levar embora! – a voz de Austin agora era de pânico. Perguntei-me se ele havia visto o que o pai tinha feito com seus pais adotivos.
- Austin, escute com atenção. Esse telefone de onde você está ligando é um celular?
- Sim, é do Dr. Fisher, eu peguei quando- - sua voz morreu e ai soube que ele havia visto seus corpos no chão da sala.
- Está tudo bem, vocês vão ficar bem. Quero que coloque o celular na sua mochila e não desligue, entendeu? Preciso que a ligação não termine para que eu possa encontrar vocês.
- Ok...
- Austin, vai ficar tudo bem. Brianna e eu já estamos a caminho, nós vamos trazer vocês de volta. Agora coloque o celular na mochila para seu pai não ver e fique junto de sua irmã.
- Eu vou tomar conta dela.
- Sei que vai, você é um ótimo irmão para Molly.
- Ele está vindo nos buscar, vou esconder o telefone.
- Agüenta firme, já estamos chegando.

Liguei para Karpowski do celular de Brianna e ele rapidamente começou a rastrear a ligação ainda ativa no meu. Dois minutos depois ele conseguiu a localização exata do sinal, mas ele não estava mais parado. Jason já estava em fuga com as crianças e se dirigia para o sul. Karpowski avisou pelo rádio que já estava enviando reforço da delegacia mais próxima de onde eles estavam e que deviam alcançá-los antes de nós. Liguei a sirene da viatura e pisei fundo no acelerador.

- Por que ele está fugindo em um carro? Ele é bruxo, não seria mais eficiente aparatar? – perguntei a Brie enquanto dirigia a toda velocidade.
- Ele não pode, está sendo rastreado. A condição para a condicional era que ele estava proibido de usar magia – ela explicou e agora as coisas faziam mais sentido – O Ministério está monitorando-o de perto e qualquer sinal de magia alguém aparata ao seu lado e o leva preso.
- Para o azar dos Fisher, métodos trouxas de crime quase sempre têm o mesmo final.

Um bloqueio foi montado em todas as estradas que saia da cidade e o reforço enviado por Karpowski parou eles quase chegando a Kent. Um verdadeiro circo havia sido armado quando os alcançamos. Jason estava atrás do volante de uma van branca, como Austin havia dito, e as crianças estavam no banco do carona olhando apavoradas o pai sacudir uma pistola na direção dos policiais que cercavam o veiculo.

- Qual é a situação? – perguntei para um dos policiais do cerco.
- Ele não está ameaçando as crianças, mas não podemos nos aproximar enquanto ele tiver armado.
- Ele não vai fazer mal a elas, está desesperado para tê-los de volta – Brianna disse ao meu lado.
- Bom, depois de assassinar duas pessoas, acho que podemos dizer que esse barco já naufragou – comentei e eles assentiram em concordância.
- O que quer fazer, detetive? – o policial encarregado do cerco se aproximou – Ele está ficando cada vez mais agitado.
- Deixe-me tentar falar com ele, não interfiram – tirei o rádio e a arma da cintura e entreguei a ele – Venha comigo, Brie. Ele conhece e confia em você.

Aproximamos-nos lentamente da van, eu com as mãos erguidas para mostrar que estava desarmado e não faria nada contra ele. Jason imediatamente nos mandou recuar e apontava a pistola que segurava na nossa direção, mas suas mãos tremiam tanto que duvidava que conseguisse apertar o gatilho. Também não ameaçava ferir as crianças, o que era um ótimo sinal, tornaria tudo muito mais simples.

- Para trás, estou avisando! – ele gritou mais uma vez.
- Não posso fazer isso, Jason, e você sabe o porquê.
- Deixe-nos ir embora! Eu só quero cuidar dos meus filhos em paz!
- Não podemos deixar você levá-los embora – Brie falou firme – Por que não os deixa sair e então podemos conversar com calma?
- Ela está certa, Jason. Ninguém mais precisa se machucar, nem mesmo você. Deixe as crianças saírem e então conversamos.
- Eu matei duas pessoas, acha que sou idiota? Nenhuma conversa vai me livrar de Azkaban. Sei muito bem que é para lá que vão me mandar!
- Papai... – Austin segurou seu braço com força e o encarou nos olhos. Não parecia uma criança de 5 anos naquele momento – Por favor, faz o que eles estão pedindo.
- Não posso, filho. Se deixá-los ir, nunca mais vou tê-los de volta.
- Mas eu não quero que o senhor se machuque – Austin se debruçou por cima da irmã e o abraçou apertado.

Molly começou a chorar, assustada com tudo que estava acontecendo e sem entender direito, e foi naquele momento que os olhos de Jason ficaram vermelhos. Olhei para Brie e ela fazia força para não chorar vendo o apelo daquelas crianças para que o pai fizesse a coisa certa.

- Jason, você está assustando seus filhos – Brie se aproximou mais do carro – Deixe-os ir.
- Você está cercado de policiais armados e nenhum deles vai deixá-lo sair daqui com esse carro. Como acha que isso vai terminar? – dei mais um passo a frente e apoiei as mãos na janela do carro – Quer traumatizar seus filhos para o resto da vida deles?
- Vão, saiam – ele disse beijando a cabeça dos dois, mas sem soltar a arma – Vão com a Brianna.
- Papai... – Molly o abraçou outra vez, ainda aos prantos.
- Eu vou ficar bem, podem ir.

Brianna deu a volta depressa e abriu a porta do carona, tirando os dois do carro o mais rápido que pode. Continuei ao lado de Jason sem tentar nada até que ela já estivesse do outro lado da rua com as crianças seguras, então agarrei a mão que ele segurava a arma. Foi um movimento tão rápido que não deu a ele tempo de reagir, não esperava que eu fosse tentar desarmá-lo tão cedo. Atirei a arma para longe e o policial que estava mais próximo do carro a pegou.

- Jason North, você está preso pelo sequestro de Austin e Molly North e pelo assassinado de Richard e Sarah Fisher – disse enquanto o tirava de dentro do carro e o prendia com as algemas – Você tem o direito de permanecer em silencio e tudo que disser pode e será usado contra você no tribunal. Você tem o direito de ter um advogado. Se você não puder pagar um advogado, um defensor público lhe será indicado. Você entende os seus direitos?
- Sim, entendo.
- Ótimo – disse empurrando sua cabeça para baixo para que entrasse em minha viatura - Porque você nunca mais vai sair de Azkaban.

((Continua...))

Posted: terça-feira, 4 de dezembro de 2012 by Justin B. D. Silverhorn in
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- Wow! Não consigo me mexer.- Haley disse enquanto respirava fundo, e acabei rindo enquanto eu levantava a cabeça que estava escondida debaixo dos lençóis aos pés da cama.
- Molenga...Isso porque é uma atleta.- e ela se ergueu nos cotovelos e franziu os olhos:
- Não tenho forças nem para te chutar pela provocação...- resmungou e minhas mãos agarraram seus pés e a puxei para mim, sem cerimônia. Ela gritou espantada e quando percebeu eu já estava por cima dela novamente, e ela fez biquinho, do jeito que costuma fazer quando briga comigo.
- Vamos brigar novamente? – eu quis saber e ela me olhou um brilho travesso nos olhos:
- Não, embora sexo de reconciliação seja fantástico. Não sei se a cama aguentaria outra rodada.Seu quarto está uma bagunça, até parece a cena do Amanhecer 1, só faltam as penas voando.- fiz uma careta de desgosto, e ela riu pois conseguiu me obrigar a assistir ao filme inteiro.
- Ainda bem que desta vez quem levou a melhor foi o lobo.E ele ainda está faminto...- eu disse presunçoso e ela riu provocando:
- Quem disse que precisaríamos da cama? – sorri e a beijei, ela se aproveitou da minha guarda baixa e me empurrou, fazendo com que eu caísse da cama, enquanto se levantava rápido e pegava minha camisa e a vestia dizendo:
- Vamos pegar alguma comida, ainda podemos recriar outras cenas dos meus filmes favoritos, ficarei quase duas semanas fora, preciso de boas memórias para não sentir saudades. - e eu respondi, enquanto colocava as minhas calças:
- Ok, mas nenhuma cena que envolva as bancadas da cozinha ou os sofás da sala, senão Rupert me despeja.
- Posso ser criativa.- ela respondeu mordendo o lábio, enquanto a gola da minha camisa grande demais para ela, deixava um de seus ombros descoberto. Engoli seco e disse áspero:
- Droga! Vamos logo buscar esta comida, duas semanas longe de você serão um inferno.

o-o-o-o-o-o-o-o

Hospital St. Mungus, Terceiro Andar, Envenenamentos por poções ou plantas:

Eu e minha boca grande. Depois de seis meses de muito estudo, teorias e práticas, os plantões de 48 horas passaram a ser uma rotina diária em nossa vida, e eram insano.  Pegávamos os casos mais malucos, e sempre que nos encontrávamos pelos corredores, eu, JJ e Clara, comparávamos nossos pacientes, para ver quem estava com o caso mais interessante do dia. E quando o caso, era muito bom, o vencedor se auto proclamava, Rei do St.Mungus. Idiota, é claro, mas precisávamos ter nossos momentos descontraídos no hospital.
A doutora Louise Storm, mãe da Clara, era nossa chefe e um osso duro de roer. Ela era uma das lendas no hospital e todos queriam estar em seus casos, ela tinha a capacidade de nos fazer calar com apenas um levantar de sombrancelha e um olhar glacial, e entre os internos ela tinha o apelido de Medusa. E seu olhar foi o que bastou, quando me mandou ficar no terceiro andar, onde os casos mais chatos com bruxos desatentos com poções ou plantas venenosas ocorriam. Ora, quem em sã consciência bebe uma poção regurgitadora à toa, apenas para pagar uma aposta?  O serviço era um porre. Nos limitávamos a avaliar o caso, dar poções para cortar o efeito do veneno, faziamos curativos nas erupções purulentas...Enfim, era a parte chata do trabalho, mas apesar disso , eu amava ser curandeiro, mas alguns dias era dificil manter este amor.
- De novo, senhor McMannus?- eu perguntei cansado, após ver meu uniforme limpo coberto de vômito, pela quarta vez nas últimas três horas e o velhinho maltrapilho com cara de papai noel, teve a decência de parecer  constrangido:
- Desculpe, doutor, eu avisei que não me sentia bem para levantar da cama.
- Mas o senhor já foi medicado contra o envenenamento por sumagre venenoso, suas erupções já desapareceram, não é comum ter este tipo de reação com a poção que administrei. Diga a verdade: o senhor bebeu quanto antes de entrar aqui?- e ele fez um ar ofendido, enquanto eu fazia um feitiço rápido de limpeza em mim:
- Eu não bebo, mocinho. Quer dizer, não deste jeito. Eu só me sinto mal às vezes, só isso.Pode me dar algum remédio?- continuei a examina-lo quando a cortina se abriu e a doutora Storm entrou apressada. Cumprimentou o paciente, verificou sua ficha, e depois disso me chamou de lado, franzindo o nariz:
-Porque ainda não liberou o senhor McMannus, Justin? E que cheiro é este?
- Ele não teve tempo de pegar a bacia para vomitar e eu estava no caminho. Eu estava avaliando-o novamente, acho que ele precisa de exames mais detalhados doutora Storm.
- Seus exames estão normais. O problema dele, é ressaca, já aconteceu outras vezes, pois ele sempre volta atrás de algum remédio. Dê uma poção dupla para ressaca, alguma comida e  libere o leito. Você é necessário em outros setores do hospital e eu preciso daquele leito vazio. E por favor, tome um banho, você está fedendo. – ela saiu e nem me deu tempo de pedir que ela me desse mais algum tempo com este caso, pois ele me incomodava. Olhei para o paciente, e o olhar dele sem esperanças, me fez pensar que talvez valesse a pena desobedecer à minha chefe. Após uma hora, ela veio atras de mim saber do paciente e vinha acompanhada de Ethan, que devia ter acabado de sair do trabalho, pois usava um casaco pesado por cima do uniforme azul escuro do pronto socorro do hospital onde trabalhava.
- Doutor Silverhorn.- ele cumprimentou sorrindo e eu reribui:
- Doutor Warrick.- e a mãe da Clara, já foi direito ao assunto:
- Justin, porque você pediu mais uma avaliação do senhor McMannus, se deu alta a ele uma hora atrás?
- Não dei alta doutora Storm...- Ethan arregalou os olhos e me encarou. A Medusa me olhou de cima a baixo:
- Onde ele está?- ela perguntou com voz controlada.
- Bem ali. - E apontei para a cama do senhor McMannus, onde antes havia um velhinho sujo e maltrapilho, agora havia um senhor de idade, de banho tomado, barbeado e de roupas limpas.- ela me lançou aquele olhar e eu me defendi:
- Pobres não recebem atendimento médico adequado, mesmo no mundo bruxo e isso é injusto. Costumo seguir meus instintos doutora, e acredito que ele mereça uma segunda opinião, por isso o mantive no hospital.Sei que posso ser punido por desobedecer a uma ordem, mas pelo menos fiz o meu melhor como curandeiro.  – e ela me olhou pensativa:
- Sim, isso é certo. O curandeiro geral já foi avisado?
- Sim, mas parece que está preso em um caso de varíola de dragão...- ela olhou para Ethan.
- Pode dar a segunda opinião neste caso? Preciso subir para a Obstetrícia, verificar minha paciente, e eu realmente quero que este caso seja encerrado.
- Sem problemas, se não encontrar nada, eu mesmo assino a alta. Ainda tenho crédito com a direção.  – ele respondeu e ela assentiu sorrindo orgulhosa e nem me olhou novamente quando saiu, deixando-me com meu cunhado, que se virou para mim:
- Atualize-me, enquanto vejo a ficha do paciente.E que seja bom, ou você vai repensar sua carreira. – e já se encaminhou ao paciente e enquanto eu relatava os detalhes do caso, como enxaqueca e vômitos, Ethan o examinava, minuciosamente. Quando terminou disse:
- Senhor McMannus, o senhor sofre de uma síndrome de vômitos cíclicos, SVC. É uma doença comum na infância, mas em casos raros pode ocorrer com adultos. O paciente não apresenta nada nos exames, porém tem náuseas e vômitos por dias e de repente os sintomas pausam e do nada eles retornam.
- Achei que fosse a bebida, que me causasse isso, doutor.- e ele me olhou sem graça quando bufei:
- Não me olhe assim, eu bebo às vezes, sim. Não tem cura? - e Ethan fez que não:
- Enxaqueca é uma das causas dos seus problemas, e isso nós podemos tratar., e você terá uma qualidade de vida melhor. – Ethan me orientou a como prescrever a medicação, quais poções eu deveria buscar na farmácia. Após medicar o senhor McMannus, e lhe dar comprimidos que iriam durar pelo menos um mês, ele nos agradeceu muito e foi liberado. Olhei para Ethan:
- Obrigado.Mas o que veio fazer aqui? Saudades do emprego? – e ele riu:
- Embora trabalhar com a Medusa tenha seus bons momentos, gosto de onde estou. Sabe que com um filho pequeno e o abrigo, não tenho muito tempo livre. Você pegou um caso de diagnóstico difícil, e fez o correto:  ouviu os seus instintos. Quando seu plantão acaba? Quero conversar com você, enquanto jantamos. – olhei no relógio e sorri:
- Já está quase acabando, vou me apresentar à minha chefe, ouvir a bronca e poderemos ir.
Fomos jantar na lanchonete trouxa que ficava perto do St. Mungus,e enquanto eu devorava um cheeseburguer com fritas, Ethan e eu colocávamos o papo em dia. O paciente havia sido cuidado, e isso era o que fazia o dia infernal, valer a pena.   

Posted: segunda-feira, 3 de dezembro de 2012 by Autor convidado in
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Londres, setembro de 2018.

- Essa aula é um saco, viu? – Thomas comentou da mesa atrás da minha.
- Nós só tivemos duas delas até agora – Julian riu.
- Mas eu já sei que não gosto.  Definitivamente não quero ser um detetive.
- E você quer seguir que caminho então? – Kaley perguntou da mesa ao lado, revirando os olhos.
- Algo mais no estilo SWAT – ele respondeu e James e Julian começaram a cantar a musica tema do filme. Thomas aproveitou a deixa para imitar a dança de um dos personagens e todo mundo riu – Não quero investigar o motivo do crime, quero só prender o culpado e atirar nele se for preciso.
- Essa parte investigativa parece interessante, tenho curiosidade em saber o motivo para aquela pessoa ter cometido o crime – comentei e James assentiu concordando comigo – Quero poder seguir as pistas até descobrir quem é o culpado.
- Então você seque as pistas e depois me chama para chutar o traseiro dele.
- Ninguém vai chutar o traseiro de ninguém por hoje – ouvimos a voz do professor e em questão de segundos todos estavam de pé em posição de sentido diante de suas mesas – Descansar – ele disse e nos sentamos.

Se tinha uma coisa que o agora Tenente Wesley Sanders impunha, era respeito. Todo mundo caçoava do Tenente, ele era um tipo difícil de não ser notado, sempre com aquele chapéu de cowboy na cabeça sem se importar para o que pensavam, mas todos o respeitavam. Ele fez das nossas vidas um verdadeiro inferno em nosso primeiro ano na academia, mas agora havia se transformado em uma espécie de conselheiro. Ele ainda pegava no nosso pé e nos dava as mais insanas punições quando alguém cometia um erro, mas a porta de sua sala estava sempre aberta e ele estava sempre disposto a ouvir e ajudar.

E ele também era o nosso professor na aula de Investigação Criminal. E era a melhor aula do mundo.

- Todos deixaram os relatórios da última aula aqui? – ele perguntou indicando a caixa onde deixávamos todos os trabalhos e todos responderam “sim senhor” – Ótimo, então vamos seguir em frente. Quem sabe me dizer o que é um Arquivo Morto?
- Arquivo Morto é como chamam os casos que são arquivados sem uma solução, senhor.
- Muito bem, Beckett. Arquivo Morto é exatamente isso, casos sem solução. Há milhares deles no depósito da Scotland Yard e de qualquer outra agencia do mundo.
- Está querendo dizer que o crime perfeito existe? – Lena perguntou parecendo descrente.
- Ah, o pior pesadelo de qualquer policial, bruxo ou trouxa. Infelizmente, às vezes eles cometem um crime perfeito. Todo policial vai se deparar com um desses em algum momento da carreira.
- Nem pensar, nenhum caso meu vai ficar sem solução! – Hector disse presunçoso.
- Todos dizem isso quando estão na academia, mas às vezes a trilha simplesmente desaparece. Nem sempre é um assassinato, pode ser um seqüestro ou um desaparecimento sem explicações. Um dos casos sem solução que trabalhei que mais me intrigou, e me intriga até hoje, foi o desaparecimento de duas pessoas sem qualquer vestígio. Sem indícios de assassinato, seqüestro ou qualquer outra coisa. Eles simplesmente evaporaram. Trabalhei nele por dois longos anos, até o detetive responsável encerrar o caso por falta de novas pistas.
- Quando o caso é encerrado, a gente simplesmente deve fingir que nada aconteceu? – Penny perguntou agora e parecia indignada.
- Tecnicamente sim, mas ninguém realmente esquece. Você pode não investigar mais, mas os detalhes nunca vão embora. Se você por acaso esbarrar com algo que lembre o caso, ele sempre pode ser reaberto. Eu nunca realmente parei de procurar aquelas pessoas, só não tenho mais isso como prioridade na minha mesa.
- Se os crimes não param você também não pode parar – Kaley disse automaticamente e todos olharam para ela – É o que meu avô diz.
- E ele está certo, mas hoje vocês não vão aprender a seguir em frente. Hoje vocês terão a chance de reviver um caso antigo e dar uma nova perspectiva a ele. Vamos até o depósito de arquivos mortos da Scotland Yard e cada um de vocês escolherá uma caixa com um caso sem solução. Vocês podem abrir uma por uma até encontrar algo que achem interessante ou simplesmente pegarem a primeira que verem, não importa. Vocês trarão a caixa para o quartel e terão até o fim de novembro para estudar o caso. Quero que façam um relatório completo dele, tudo que aprenderam lendo os documentos, e no fim quero ouvir a sua opinião sobre ele. O que vocês fariam de diferente que talvez ajudasse a solucionar o caso?
- Nós podemos entrar em contato com as testemunhas? – James perguntou animado.
- Sob hipótese alguma vocês devem incomodar essas pessoas. Se encontrarem algo relevante, coloquem no relatório e apenas isso. Eu vou ler um por um e se achar que encontraram algo que valha a pena checar, eu mesmo entrarei em contato com as testemunhas. Se o caso for reaberto, o aluno que o estudou será convidado a ajudar na investigação.

A sala se agitou na mesma hora. Uma chance de ajudar em um caso de verdade? Nunca passou pelas nossas cabeças que realmente pudéssemos ter a chance de fazer isso ainda na academia. O Tenente Sanders ordenou que nos aprontássemos e em cinco minutos já estávamos do lado de fora do quartel no ônibus que nos levaria até a sede da Scotland Yard.

O depósito era imenso. Estantes gigantescas com caixas e mais caixas de casos sem solução. Aquilo era mesmo um pesadelo. Como é possível tantos criminosos ficarem impunes porque ninguém conseguiu encontrá-los? Eu nunca conseguiria deixar algo de lado.

- Tomem cuidado para não perderem nenhuma evidencia. Tudo dentro das caixas está catalogado e se algo sumir enquanto estiverem com ela, vai ser um grande problema – ouvimos o Tenente Sanders dizer antes de nos liberar – E lembrem-se da aula de Criminologia Forense: não toquem em nenhuma evidencia se não estiverem usando uma luva de látex.

A turma imediatamente se dispersou. Cada um foi para um lado vasculhar os arquivos até encontrar algo interessante, mas eu já sabia exatamente o que queria levar. As caixas estavam organizadas em ordem alfabética por sobrenome, então caminhei direto até a letra B. Perdi quase 10 minutos, mas encontrei o que queria na prateleira do meio. Com a ajuda de uma escada, arrastei a caixa com a etiqueta “BRENNAN, J e K” até a mesa. Era o caso não solucionado do desaparecimento dos meus pais.

°°°°°°°°°°

Rupert ainda estava na editora quando cheguei ao loft, então usei minha chave para entrar e espalhei o conteúdo da caixa de evidencias em cima da mesa. Saímos da sede da Scotland Yard direto para o quartel, ainda tínhamos duas aulas no dia, mas depois estávamos liberados pelo fim de semana, então ainda não havia tido a chance de ver o que tinha dentro dela. A primeira coisa que vi quando abri a caixa foi um saco plástico lacrado com o colar com pingente de elefante e a aliança de minha mãe. Ela nunca os tirava. Não sei por quanto tempo segurei a embalagem nas mãos, mas não ouvi Rupert chegar.

- Ei, chegou tem muito tempo? – disse me beijando e me assustei – Está tudo bem? O que é isso?
- O caso do desaparecimento dos meus pais. Vou estudar ele como projeto do semestre.
- Como é que é? – ele sentou confuso ao meu lado, esticando a mão para pegar um dos relatórios.
- Aula de Investigação Criminal, temos a chance de reabrir o caso que escolhemos se encontrarmos alguma pista relevante. Eu precisava trabalhar nele.
- Ok, agora entendi. Quer ajuda?
- Normalmente eu recusaria, isso é um trabalho do curso que devo fazer sozinha, mas...
- É o caso dos seus pais, você precisa encontrar uma pista – assenti e ele sorriu – Conte comigo, então. O que quer que eu faça?
- Fica com essa parte, vou lendo essa outra – separei as pilhas de relatórios e ele pegou a parte dele – Depois um explica pro outro o que leu.

Rupert levantou da cadeira com os papéis na mão e beijou minha testa antes de caminhar até o sofá. Deixei a embalagem em cima da mesa e peguei a minha metade, sentando ao lado dele no sofá e enterrando o rosto nos relatórios.

°°°°°°°°°°

- Talvez eles sejam espiões.

Abaixei o relatório que lia pela segunda vez e olhei para Rupert com uma sobrancelha erguida. Estávamos lendo e relendo toda a investigação há mais de duas horas, mas não havíamos encontrado nada que nos chamasse a atenção. Encontrei o nome do Tenente Sanders em um dos relatórios, o que revelou que era dos meus pais que ele falava na aula. E ele tinha razão: eles tinham simplesmente evaporado.

- Espiões? Acho que sua imaginação está indo longe demais.
- Eu sou um escritor, pode me culpar?
- Você não escreve ficção.
- O que estou escrevendo agora pode ser uma historia real, mas isso não significa que minha cabeça não esteja fervilhando de novas ideias.
- Tem algum livro novo em mente? – perguntei animada, mas ele reagiu um pouco estranho.
- Não exatamente, ainda é só uma ideia. Quando tiver uma história organizada, prometo contar – assenti sem insistir e ele pareceu aliviado – Então, espiões. É possível.
- Como isso é possível? Minha mãe era uma professora de piano.
- Se eles fossem espiões da CIA, por exemplo, nenhum detetive ia conseguir encontra-los. Só outro espião. Isso explicaria muita coisa, como eles desaparecerem sem deixar vestígio e deixando vocês para trás.

Não consegui impedir que uma risada escapasse ouvindo Rupert desenvolver aquela teoria maluca sobre meus pais serem espiões. Ele não acreditava mesmo que aquilo fosse possível, estava apenas tentando me animar, porque se meus pais fossem espiões da CIA significaria que estavam vivos. Que haviam desaparecido para nos proteger. Significaria que eles não eram egoístas e não nos abandonaram porque não nos queriam mais, mas sim porque queriam que vivêssemos uma vida normal. Não seria tão ruim assim se fosse verdade.

- Isso é muito 007! – ele concluiu depois de descrever todo o suposto plano de fuga deles.
- Eu amo você, sabia? – era a primeira vez que dizia aquilo, mas não parecia ter um momento mais apropriado.
- Eu sei – ele respondeu sorrindo e inclinou o corpo para me beijar – Eu também te amo.
- Espiões, então? É, até que não é uma teoria tão maluca assim.
- Uau, você me ama mesmo – disse surpreso e ri.
- Foco, Rup.
- Certo, espiões. Vamos elaborar essa teoria mais um pouco.  O que você se lembra da sua infância em casa? Talvez a gente encontre uma dica indo nessa direção.
- Não muita coisa, eu era muito pequena, mas lembro que passava mais tempo com a minha mãe. Papai estava sempre fora, viajando a trabalho.
- O que ele fazia?
- Não faço ideia, tudo que sei é que ele carregava uma pasta preta – ele riu e o empurrei – Ei, eu só tinha sete anos, não tive a oportunidade de convidar ele para o dia da carreira na escola para descobrir.
- Ok, então sua mãe ficava em casa e seu pai trabalha fora. Talvez Russell saiba a profissão dele.
- É possível, mas Russ foi para Hogwarts quando eu tinha um ano e ficou lá até eles desaparecerem, éramos só mamãe e eu mesmo. Embora...
- O que? Você está com cara de interrogação.
- Depois que eu fiz cinco anos, mamãe passou a viajar a trabalho com papai com bastante frequência. Eles ficavam mais tempo fora do que em casa.
- Ela fazia concertos? – sacudi a cabeça negando – Por que uma professora de piano viaja por tanto tempo, se não for para apresentações?
- Não faço ideia, mas enquanto eles estavam fora juntos, eu ficava com uma babá. Cindy,eu  acho.
- Não lembro de ter visto nenhum depoimento de uma babá nesses relatórios, qual era o sobrenome dela?
- Sete anos, Rup. Sete anos – ele riu – Russ talvez saiba, eles viajaram durante toda as férias de verão de 2004 e ela ficou conosco por dois meses. Ele já tinha 15 anos e uma paixão platônica pela babá, é provável que lembre.
- O que mais você lembra?
- Mais nada de relevante, não que o que eu já tenha dito seja – disse um pouco desanimada e ele apertou meu joelho.
- Ei, nós vamos encontrar alguma coisa. Vamos conseguir reabrir o caso.

Dei um sorriso não muito convincente e Rupert me puxou para junto dele, envolvendo os braços em volta de mim. Deitei a cabeça em seu peito e deixei que ele apertasse mais o abraço. Não fazia ideia de como íamos conseguir convencer o Tenente Sanders a reabrir aquele caso, mas eu precisava tentar. Eu queria muito a minha mãe. 

Posted: domingo, 25 de novembro de 2012 by Rupert A. F. Storm in
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Acordei desanimado naquela manhã de 6 de junho de 2018. Fazia exatamente um ano que Brittany e Timothy haviam morrido na explosão que causei e já fazia um tempo que não pensava nos dois ou no que aconteceu, mas tudo voltou como um flash no instante em que abri os olhos. Naquele momento soube que seria um péssimo dia.

Minhas memórias daquele 1º aniversário da morte deles são um pouco confusas. O que lembro com clareza é que tinha uma consulta com o Dr. Pace naquela manhã, mas não apareci em seu consultório. Sabia exatamente o que ele diria e não queria ouvir. Lembro também de ter ignorado uma dezena de ligações durante o dia. E principalmente, lembro-me de ter ido até o cemitério onde os dois estavam enterrados.

James estava lá quando cheguei, ajoelhado ao lado do tumulo de Brittany com uma aparência pior que a minha. Segurava um buque de flores com tanta força nas mãos que por um instante achei que fosse esmaga-las, mas as depositou diante da lápide quando me viu e ficou de pé.

- Gérberas eram as favoritas dela – disse suspirando – Nunca dei uma única flor delas a ela, com medo de que tivesse a impressão errada. E agora trago um buque inteiro.
- Sinto muito – foi tudo que consegui dizer enquanto apertava seu ombro.
- Não esperava vê-lo aqui.
- Para falar a verdade, nem eu. Não havia percebido para onde ia até ver a entrada do cemitério.
- Ainda se sente culpado? – ele perguntou e quando não respondi, sacudiu a cabeça – Cara, você precisa parar com isso. Não foi sua culpa, você salvou muita gente.
- Eu sei, não é culpa o que sinto. Não sei explicar o que é e isso me deprime, sou um escritor – ele riu um pouco, mais relaxado – Só achei que devia vir aqui, por respeito, entende? – e ele assentiu.
- Tínhamos tantos planos, sabe? – James sentou no chão outra vez e sentei ao seu lado – Britt ia cursar direito em Cambridge e me fez prometer acompanha-la. Eu nunca nem quis ser advogado, concordei só para fazê-la parar de encher o meu saco.
- Você agora está cumprindo a promessa, não é? – perguntei e ele assentiu.
- Foi a primeira coisa que fiz quando voltei de Hogwarts. Consegui uma bolsa e tenho conciliado a academia com as aulas.
- Como você faz pra assistir a elas? Não ficou o primeiro mês preso no quartel?
- Eu não assisto às aulas na universidade, faço a distancia. Eles me mandam o material, eu estudo e faço todos os trabalhos sozinhos e só vou até lá fazer as provas. E muitas matérias eu já tenho na academia, então pude cortar uma boa parte da grade. Posso assistir às aulas quando quero e sempre que tenho tempo faço isso, mas é muito raro.
- Deve ser exaustivo.
- É, mas é o mesmo sentimento que você não consegue explicar. Britt sempre me incentivou a fazer isso dizendo que ia me ajudar com a carreira na policia. É como se eu devesse isso a ela, sabe?

Eu sabia exatamente o que ele queria dizer. Não era justamente por sentir que devia algo a eles que eu estava ali? Ficamos um tempo em silencio sentados na grama, depois caminhamos até a lápide de Timothy e James contou algumas histórias que me ajudaram a conhecer outro lado do garoto que me atormentou por tanto tempo. Nós nunca seriamos amigos, mas ouvindo a forma com que James falava dele, soube que não era uma má pessoa.

Deixamos o cemitério quando vimos os pais de Timothy se aproximando. Meu primeiro impulso seria falar com eles, embora não soubesse o que poderia dizer, mas James me puxou pelo braço na direção contrária. Ele tinha razão, era melhor não ir até eles. Se não tínhamos nada de útil para dizer, e nada que você diga aos pais que perderam seu filho no 1º aniversário da morte dele será útil, era melhor calar a boca e se retirar.

Não me lembro de quem foi a ideia, mas do cemitério fomos direto para um pub que ficava no bairro vizinho. Ainda eram 11h da manhã quando entramos e com identidades alteradas com magia, pedimos duas doses de tequila. Lembro-me de, ainda sentados no balcão, termos pedido mais duas rodadas. E depois disso tudo é um grande borrão.

Minha próxima lembrança é de acordar em um lugar que não reconheci de imediato. Estava em uma cama, disso eu tinha certeza, mas onde era aquilo? Olhei em volta confuso e reconheci a decoração como sendo o antigo quarto de Connor, no apartamento que dividia com Nick. O que eu estava fazendo ali?

- Ah, bom dia, Kurt Cobain – ouvi a voz de Nick vindo de algum lugar em minha mente e virei a cabeça rápido demais. Achei que ia morrer.
- Nick. O que houve? – olhei para o lado, dessa vez movendo a cabeça devagar – James, onde ele está?
- Ele acordou há meia hora, vomitou no chão da minha sala e saiu apressado de volta pro quartel. Já deve estar levando a punição do século por ter perdido um dia inteiro de aula.
- Um dia inteiro...?
- Hoje é dia 7.
- O que aconteceu com o dia 6? – eu estava muito confuso, meu cérebro não conseguia funcionar.
- O que aconteceu foi que vocês beberam até não poder mais e eu os resgatei do bar – devia estar com cara de interrogação, porque ele continuou – Quando Amber viu que James desapareceu e você não atendia suas ligações, deduziu que algo estava errado e que tinha relação com o que o dia de ontem representa a vocês dois, então me ligou. Rastreei seu celular e encontrei vocês quase desmaiados no balcão, de tão bêbados que estavam.
- Droga, ela deve estar uma fera.
- Acho que ela vai ser mais compreensiva do que pensa, estava preocupada quando me ligou, mas não aconselho a ignorar as ligações da sua namorada outra vez, por mais depressivo que esteja.
- Eu não estava depressivo. Não planejei nada disso.
- Acredito em você, mas não torne isso uma tradição, ok? Outros dias 6 de junho virão e não quero ter que busca-lo em um bar todo vez – e assenti, o que fez com que minha cabeça rodasse.
- E o que houve com você? Está com uma cara péssima.
- Ouvir isso do cara descabelado com olheiras de panda e de ressaca é deprimente – ele sacudiu a cabeça rindo, mas sabia que algo estava errado.
- O que aconteceu? – insisti e sentei na cama tentando me orientar.
- Só estou cansado.
- Cansado de alguma coisa especifica ou...?
- Cansado de tudo, na verdade. Fizemos show essa semana, cheguei em casa quase 2h da manhã e antes das 6h tive que levantar e correr para a delegacia. Não aguento mais essa jornada dupla, não sei por mais quanto tempo consigo manter essa vida.
- Está pensando em desistir de um dos dois? – perguntei e me surpreendi quando ele assentiu – Não achei que um dia fosse ouvir isso. Vai desistir de ser detetive? – quando ele não respondeu, fiquei ainda mais surpreso – Vai largar a banda??
- Não sei, Rup. Esse é o problema. Eu não sei o que fazer. Minha única certeza é que não aguento mais ser um músico e um detetive ao mesmo tempo. Eu preciso escolher, mas não sei qual.
- Bom, acho que o simples fato de você estar em dúvida já diz qual você não quer abandonar. Você sempre quis ser músico, seu pai teve que lutar para convencê-lo a entrar para a academia de auror. Se hoje você está hesitando entre ficar com o que sempre quis ser e o que nunca pensou em ser, é porque alguma coisa mudou.
- Ok Dr. Pace, chega de forçar o cérebro por hoje – disse quando apertei a testa com uma cara sofrida – Gabriel ligou para o seu celular há uma hora e atendi. Disse que tinha uma reunião ao 12h, mas expliquei você não tinha condição de tomar decisões inteligentes tão cedo assim e ele conseguiu empurrar para às 16h. Disse que é melhor aparecer na editora, sóbrio ou não, então vou leva-lo em casa e ser sua babá por hoje, me certificar de que vai chegar à Black Pawn na hora certa.
- E o seu trabalho?
- Hoje é a minha folga. Por que acha que estou tendo tempo de pensar?

Assenti sem conseguir formar mais nenhuma sentença coerente e levantei da cama, deixando que ele me dissesse o que fazer e para onde ir. Já havia exercitado demais o cérebro naquela manhã, precisava poupá-lo para o que quer que me estivesse me esperando na reunião. Nick tinha razão, eu não podia deixar que isso virasse uma tradição.

Infelizmente, aquilo seria uma tradição pelos próximos cinco anos.

Posted: terça-feira, 20 de novembro de 2012 by Clara Storm Lupin in
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Março de 2018


Não sei exatamente onde estava com a cabeça quando decidir me tornar uma Curandeira, mas sem dúvida não estava com o juízo perfeito. Os primeiros meses foram motivadores, mas depois de seis meses vieram os primeiros plantões de 48 horas e o animo já não era mais o mesmo. E como se já não fosse estressante o bastante passar mais de 24 horas sem dormir direito tentando não matar seus pacientes, ainda tínhamos mamãe e tia Mirian rondando o hospital dia e noite supervisionando cada respiração nossa. Se você acha que ter sua mãe e sua tia como chefes é algum beneficio, pense outra vez. Justin, JJ e eu éramos cobrados em dobro.

Os plantões sem fim eram exaustivos e sempre chegava em casa reclamando, mas ainda não havia desistido da idéia de estudar medicina trouxa em Oxford. O envelope com a ficha de inscrição já estava em minhas mãos havia algumas semanas e tinha finalmente terminado a redação que eles pedem para nos avaliar. Estava aproveitando um momento raro de descanso para terminar de organizar tudo e colocar no correio quando bateram na porta da sala de descanso. Quando vi a cabeça do Dr. Cooper aparecer, sabia que a folga havia acabado.

- Explosão de caldeirão na maca cinco esperando por você – ele atirou a ficha para cima de mim.

Levantei do sofá sem muita pressa, mas quando bati o olho no nome do paciente na prancheta, disparei porta afora. Sheldon estava deitado na maca como se estivesse morrendo, pressionando um pedaço de pano contra a testa. O pano já estava ensopado de sangue e metade de seu rosto estava vermelho. Era uma cena pavorosa.

- Sheldon! O que aconteceu com você?
- Eu estava fazendo um experimento que não deu muito certo.
- Você não explodiu o apartamento, não é?
- Não, consegui carregar o caldeirão até o elevador antes de explodir. A propósito, nosso prédio não tem mais lavanderia.
- Pelo menos você está inteiro. Deixe ver o ferimento – estiquei a mão para tirar o pano de sua testa e ele saltou da maca.
- Quero um Curandeiro de verdade.
- A menos que o paciente esteja morrendo são os alunos que atendem, então deita ai e fica quieto – o empurrei de volta na maca com força.
- Você ao menos sabe o que está fazendo? – disse se esquivando quando puxei o pano ensangüentado.
- Se não parar de se mexer vou chamar um enfermeiro para amarrá-lo na maca – disse séria e ele me olhou desafiador, mas deve ter percebido que não estava brincando e sossegou – Isso é um pedaço de plástico? – disse tirando um objeto esquisito de sua testa – O que você estava cozinhando?
- Você não vai querer saber.
- Tem razão, às vezes a ignorância é uma bênção. Fique quieto um instante que já volto.

Deixei Sheldon sozinho na maca por alguns minutos enquanto pegava uma poção anestesiante e o kit para limpar o corte e fechá-lo. Era nessas horas que me sentia mais ansiosa por começar os estudos trouxas da medicina. Bruxos não usavam agulha para costumar pacientes, manter o corte na testa de Sheldon estável o suficiente para fechar sem a ajuda de um ponto não era uma tarefa simples.

- Beba isso – entreguei um frasco de poção a ele – Vai deixá-lo anestesiado.
- Você fez essa poção? – perguntou desconfiado – De onde ela veio?
- Não, Sheldon, as poções usadas no St. Mungus vêm da loja do professor Yoshi. Beba isso logo, não posso limpar esse buraco na sua testa com você sentindo dor.
- O que você vai fazer com o corte?
- Vou retirar todos os objetos estranhos que possam ter entrado nele na explosão e fazer o sangue estancar antes de fazer o curativo. Como você já sabe, não temos autorização para costurar pacientes, então terá que colaborar e seguir todas as instruções. Agora beba a poção. Vai se sentir um pouco estranho, mas não vai sentir dor quando começar a mexer em sua testa.

Sheldon ainda hesitou por um instante, mas se deu por vencido e bebeu a poção. O efeito dela começou a aparecer dois minutos depois. Quando Sheldon colocou a língua para fora e a apertou, dizendo que não doía, sabia que já estava mais que dopado. Aquela era uma das poções mais fortes que Hiro fornecia ao hospital, era mais eficaz para deixar a pessoa desorientada que algumas doses de tequila. Logo, foi muito difícil manter a pose série enquanto fazia meu trabalho.

- Eu não gostava de você, Clara – Sheldon falou depois de cansar de mexer na orelha – Você é chata, intrometida, mandona...
- Tem algum “mas” vindo? Não esqueça que estou segurando objetos cortantes perto da sua cabeça.
- Mas... – ele fez uma entonação dramática e segurei o riso – Aprendi a me adaptar. Você faz bem ao Hiro e ele traz um pouco de cultura a sua cabeça oca.
- Obrigada, eu acho.
- Por favor, não magoe meu amigo.
- Não pretendo magoar ele.
- Ótimo. Posso contar um segredo? – ele diminuiu o tom de voz e fez sinal para que me aproximasse. Já estava querendo rir, mas ainda consegui me segurar.
- Claro, o que é?
- I’m Batman! – disse imitando a voz do Batman e dessa vez não consegui não rir – Posso contar outro segredo?
- Claro, Sheldon. Minha boca é um túmulo.
- Mamãe fuma no carro. Jesus não liga, mas não conte para o papai. Não esse segredo, o outro segredo... I’m Batman!

Sheldon começou a citar falas dos filmes e aproveitei essa distração para terminar o que estava fazendo. Ele já começava a cantar o hino da Inglaterra quando passei o ultimo pedaço de esparadrapo no curativo e tirei a luva. Ele parou de falar um instante, tocou a bandagem na cabeça e fez sinal de positivo, esquecendo completamente que minutos atrás estava questionando minha habilidade de fazer um curativo.

- Ok Sheldon, espere aqui até o Dr. Cooper lhe dar alta, tudo bem? – falei bem devagar para ele não perder nenhuma informação – Não saia da maca. Isso é importante, Sheldon, está prestando atenção?
- Sim, ficar na maca. Não sair. Dr. Cooper vai me dar alta – ele estendeu a mão e a olhou fascinado – Isso parece azul pra você?
- Não, você ainda não está virando um Avatar. Já volto.

Não podia deixar Sheldon ir embora sozinho, sabe Merlin onde ele ia parar naquele estado, alguém tinha que leva-lo para casa. Liguei para Hiro para checar se ele podia vir busca-lo, mas ele estava atolado na loja e não poderia sair antes das 20h, não adiantava nada. JJ não sairia antes das 2h da manhã hoje, então acabei ficando com o abacaxi. Meu plantão terminava em uma hora, ele sobreviveria até lá. Dr. Cooper avaliou o que tinha feito e o liberou de imediato, mas expliquei que ele era meu vizinho e o levaria para casa mais tarde e ele autorizou que ele ficasse na maca até que eu saísse.

Às 18h em ponto encerrei meu plantão e fui até onde havia deixado Sheldon para resgatá-lo. Ele ainda estava em uma alucinação absurda de que suas mãos estavam ficando azuis e o reboquei ainda falando sobre o assunto até a área de aparatação. Eu costumava pegar o metrô para ir embora, ver um pouco de gente que não sejam doentes, mas não ia me arriscar a sair com ele naquele estado em um transporte publico lotado. O que foi um erro, evidentemente. Ainda sob o efeito do sedativo, assim que aparatamos no corredor dos apartamentos, Sheldon teve quase uma convulsão e vomitou toda a poção no meu pé. Se não tivesse segurando firme seu braço na hora que desaparatamos, teria desabado no chão.

O lado positivo de ter vomitado? O efeito da poção passou e Sheldon não estava mais parecendo um maconheiro. O lado negativo? Ele agora estava passando mal e eu fiquei de enfermeira a noite inteira. Todo mundo diz que homens são molengas quando ficam doentes e viram bebês, mas chamar o que Sheldon vira de bebê não seria apropriado. Ele vira a pessoa mais insuportável do mundo. Mais complicado que cuidar de uma criança doente ou um velho realmente teimoso, consegui com muito custo que ele tomasse banho (tive que encher a banheira antes e colocar a água na temperatura certa!) e colocar o pijama para deitar. Eu não sabia cozinhar, então graças a Merlin existem sopa semi-pronta, mas ainda assim tive que ouvi-lo reclamar que não estava boa, mesmo engolindo tudo. Quando Hiro chegou, já quase 22h, eu estava cantando sentada na beira de sua cama com a cara mais enfezada do mundo.

- Onde você estava? Disse que ia sair às 20h! – perguntei irritada. Não tinha a menor vocação para ser babá.
- Recebi material hoje, estava fazendo o estoque até agora pouco – ele respondeu na defensiva – Eu disse que estava enrolado!
- Podia ao menos ter ligado, não é? Estou duas horas a mais do que contei aqui!
- Não briguem! – Sheldon se encolheu na cama com as mãos tapando os ouvidos.
- Não estamos brigando, Sheldon – Hiro respondeu cansado – Só discordando.
- Já ouvi isso antes. E em seguida eu tinha que me esconder em meu quarto recitando uma palestra de Richard Feynman, enquanto minha mão gritava que Jesus a perdoaria se ela pusesse vidro no bolo de carne do papai. E meu pai está no telhado atirando na coleção dela de pratos colecionáveis de Franklin Mint.
- Não estamos brigando, vê? – levantei da cama e abracei Hiro, dando um beijo rápido nele – Ninguém vai mais gritar, nem quebrar nada.
- Então por que ainda estão com expressões zangadas?
- Ok Sheldon, você teve problemas na infância, todos nós temos nossos traumas. Cresça e supere isso! – Hiro falou impaciente e o empurrei.
- Posso resolver isso? – perguntei reprimindo a fúria e sentei na cama outra vez – Sheldon, tente entender, por favor. Hiro e eu estamos em um relacionamento e ocasionalmente nós vamos brigar. Mas não importa o que aconteça entre nós, você vai ser sempre parte das nossas vidas. Certo, Hiro?
- Sempre é muito tempo – olhei para ele séria e ele assentiu – Claro. Sempre.
- Agora você precisa dormir. Vai acordar se sentindo melhor amanha, prometo.

Saímos do quarto e apaguei a luz antes de puxar a porta, deixando Sheldon finalmente quieto e, espero, dormindo. Hiro me puxou para um abraço quando já estávamos no corredor e não resisti, deixei que ele me envolvesse com seus braços.

- Desculpe, eu devia ter ligado.
- Tudo bem, eu exagerei um pouco, cuidar dele pode ser muito estressante.
- Pode ser? – ele ergueu a sobrancelha e ri.
- Ok, é muito estressante – admiti e ele beijou minha testa – Ele é nosso filho, não é?
- Bom, você estava cantando para ele quando cheguei, acho que isso acabou com qualquer chance de negar.
- Eu sabia que ter filhos era uma péssima ideia – falei suspirando e ele riu.
- Já que nosso primogênito finalmente dormiu, que tal praticar alguns irmãos?
- Contanto que a gente fique só na prática, mostre o caminho.

Ele sorriu maroto e me beijou com vontade antes de me puxar pela mão na direção de seu quarto.

°°°°°°°°°°°

O evento mais esperado pela família Storm aconteceu no final de março. Becky estava deslumbrante em um vestido cor pérola com detalhes de rosas quando entrou na igreja de braço dado com tio George, a felicidade estampada no enorme sorriso que tinha no rosto. Connor estava nervoso perto de nós no altar. Balançava-se para frente e para trás angustiado para que ela chegasse logo. Do meu lado, Rupert não parava de olhar para Amber sentada com os outros convidados. Ele tentava não olhar, mas não conseguia. Meu primo era do tipo que queria estar ali um dia e todo mundo sabia que ele esperava que Amber fosse quem viesse ao seu encontro no altar.

A cerimonia foi curta, simples e bonita. Do lado de Connor, seu irmão Micah e sua esposa Evie e Nick e Kaley formavam os dois casais de padrinhos. E do lado de Becky, eram Rupert e eu e Ethan e Brianna. O padre era jovem e muito descontraído, fazia perguntas do tipo “Você tem mesmo certeza que quer se casar com ele? Ele vai ficar gordo e careca quando envelhecer” para Becky e “Ela não vai ter sempre esse corpinho elegante, então pense bem!” para Connor, o que arrancava risadas de todo mundo e aliviava um pouco a tensão de ambos, que só faltavam cortar a circulação um do outro tamanha era a força com que apertavam as mãos.

Se a cerimonia foi boa, a festa foi sem explicação. Mais uma vez mamãe assumiu o controle das coisas e, junto das mães de Connor e Nigel e Otter, organizaram uma recepção para ninguém botar defeito. E na hora da primeira dança já casados... Bem, essa parte vamos dizer que mamãe não teve qualquer envolvimento. Ela foi contra, a principio. Não queria fugir do tradicional, mas Connor acabou convencendo-a de que seria diferente e divertido e ela cedeu.

Os dois caminharam de mãos dadas para o centro da pista ao som de Just the way you are, do Bruno Mars, o que já não era uma música clássica de casamento, mas era uma versão mais lenta e estava tudo normal. Dançaram um pouco de rosto colado e de repente a música mudou. Começou a tocar Party Rock Anthem e os dois embarcaram em uma coreografia insana da música. Quando já estava todo mundo aplaudindo animado, todos os padrinhos e mais alguns amigos que toparam entrar na brincadeira entraram na pista e a primeira dança deles virou um flash mod. Eu tinha certeza que quando aquele vídeo fosse parar na internet e se transformasse em um viral eu me arrependeria de ter topado participar, mas na hora foi bem divertido.

Quando nada de mais impactante poderia acontecer, Connor provou que sabia como surpreender. Em segredo, com a ajuda de Nick, Nigel, Otter, Ethan, Brian e Edward, preparou um numero para Becky. Era tudo uma grande piada, é claro. Connor escolheu uma música de uma boyband que Becky era apaixonada quando tinha 15 anos e os sete bolaram uma coreografia que foi muito bem ensaiada para apresentar. Sentaram Becky em uma cadeira sozinha no meio da pista e quando a música começou a tocar e ela reconheceu a melodia, ficou quase sem ar de tanto que riu. E acho que o mesmo pode ser dito dos demais convidados. Mamãe olhava pra mim procurando uma explicação, mas eu também não sabia de nada, aquilo tinha sido obra dos meninos e ninguém mais.

Depois de um flash mob e daquela apresentação ao melhor estilo Backstreet Boys nenhuma outra surpresa apareceu, então a festa correu como qualquer outra festa de casamento. Estava na mesa com a turma e era impossível não notar que metade de nós éramos casais. Jamal não conseguiu ficar nem cinco minutos sentado e levantou reclamando que casamentos eram ótimos para se divertir sem compromisso e não ia conseguir isso sentado com casais. Quando saiu da mesa determinado, levou com ele Julian, MJ e Zach, que também estavam solteiros. Kaley e Elena ficaram na mesa conosco sem a mesma animação dos meninos, mas acho que se arrependeram logo. Nem eu sei quando aconteceu, mas o papo acabou sendo casamentos. Rupert ficou logo tenso, sabia muito bem que se tocasse nesse assunto assim tão cedo com Amber, corria o risco de ficar solteiro. Mas Keiko e JJ, Haley e Justin e Arte e Tuor falavam do assunto com tanta naturalidade que fiquei um pouco assustada. Não, aterrorizada seria a palavra mais adequada.

- Ai gente, vocês não acham cedo demais pra falar disso não? – resmunguei e ouvi Hiro rindo baixo no meu ouvido.
- Ninguém está marcando data de casamento, não tem nada demais falar sobre isso – Keiko se defendeu e os outros apoiaram.
- Bom, eu já marquei data! – Arte levantou a mão empolgada e todo mundo riu quando Tuor bateu palmas animado.
- Vocês são todos loucos. Não sei nem se quero casar ainda!
- Ah, bom saber disso – Hiro disse em tom de brincadeira e ri, mas o clima na mesa mudou.

De repente o assunto era outro, começaram a falar do flash mob e de como as pessoas reagiram surpresas e depois queriam participar. Hiro não parecia chateado com nada, participava do papo normalmente, mas eu estava incomodada. Lembrei-me de Sheldon, drogado, me pedindo para não magoar seu amigo. Será que eu havia o magoado dizendo que não pensava em me casar? Hiro nunca havia dito nada sobre isso, mas todo mundo sabia que ele era essa pessoa. Ele era o tipo que um dia quer casar e ter filhos, construir sua própria família. E eu ainda não sabia se queria isso.

- Vamos dançar? – convidei-o e ele sorriu, levantando da mesa e me estendendo a mão.
- Você está bem? – perguntou quando já estávamos fora do alcance dos ouvidos de nossos amigos – Está um pouco tensa.
- Você quer se casar? – perguntei do nada e ele me olhou assustado.
- Está me pedindo em casamento?
- Não! Merlin, não! – ele riu do meu desespero e bati em seu peito – Não tem graça.
- Clara, relaxa. Eu sei que você não é aquela menina que sempre sonhou com um vestido branco e um príncipe encantado. Sei onde estou me metendo e não ligo, porque eu te amo.
- Mas você quer isso tudo, não quer?
- Não sei, provavelmente sim, mas não penso nisso ainda. Não completei nem 19 anos.
- Obrigada! Somos novos demais para isso, não é? Arte e Tuor são dois loucos apressados.
- Dois loucos apressados e apaixonados, mas com eles é tudo muito mais intenso, era de se esperar que casassem logo. Nós somos diferentes, temos outros planos para o futuro.
- E se no meu futuro não tiver nenhum casamento e nenhum filho? Você ainda vai estar nele?
- Você me quer nele?
- Eu também amo você e não quero que isso nos afaste.
- Por que não deixamos para ter essa conversa quando chegar a hora? Temos muitos anos pela frente ainda e as coisas mudam. Olhe para você, por exemplo. Há três anos imaginava que seria mãe adotiva de Sheldon e estaria cursando medicina?
- Ou que estaria namorando você? – completei e ele segurou meu rosto para me beijar.
- Exatamente. Quem sabe daqui a uns anos você não muda de ideia e decide que quer se casar comigo?
- Isso foi um pedido?
- Ainda não, mas quem sabe no futuro...

Sorri para ele e o beijei de volta, o puxando pela mão para o meio da pista de dança. Ele tinha razão, era cedo demais para falar sobre isso. Se nossos amigos acham que é hora de pensarem em casamento, bom para eles, mas nós pensávamos diferente. Ainda tinha cinco anos de faculdade de medicina pela frente e mais sete como residente de cirurgia, não queria nem saber de nada disso até ter conquistado todos os meus objetivos. E para ser bem sincera, talvez nem depois que eu tivesse conquistado tudo isso.

°°°°°°°°°°

Em algum lugar do futuro.

Foi um plantão exaustivo. 48 horas sem dormir, me mantendo acordada à base de muito café e energético, e mais um plantão de 32 pela frente em menos de 24 horas. Precisei tomar um relaxante muscular com a capacidade de derrubar um elefante quando cheguei em casa e apaguei no instante que minha cabeça encostou no travesseiro.

Não sei por quanto tempo dormi. Pela dor que sentia em todo o corpo, não o suficiente. Amanhã seria um longo dia, já podia prever. Demorei um tempo até perceber o que me acordou. O remédio ainda estava fazendo efeito, meu cérebro estava uma bagunça. Meus olhos procuraram pelo relógio. Nem cedo nem tarde, mas ainda não era hora de acordar.

Pisquei confusa e então percebi o que havia me despertado. Tinha um pé no meu pescoço. Um pé minúsculo que havia acertado meu rosto e escorregou quando me mexi. Virei o corpo na cama com dificuldade e sorri quando vi a dona do pé espalhada no colchão embolada na coberta feito um macaco sem modos para dormir. Minha anjinha rebelde. Ele deve dê-la deixado pular para cá antes de ir trabalhar.

Mesmo com dor, me movi o suficiente para puxá-la para junto de mim. Ela se agitou quando mexi seu corpo, mas sossegou quando a abracei e não acordou. Ela era tão pequena e já tão geniosa. Mamãe se divertia dizendo que agora eu sabia o que ela passou comigo. Sorri lembrando o jeito que ela se sentiu orgulhosa quando ouviu a avó contar que era mais parecida comigo do que pensava e alisei seus cabelos, beijando sua testa.

E pensar que houve uma época em que a ideia dela um dia fazer parte do meu futuro me apavorava e nunca era cogitada. Olhando para ela dormindo aconchegada em meus braços, não conseguia entender como um dia pude viver sem ela.